Eu me lembro ainda de uma antiga noitinha de dia 24 de dezembro, já meio perdida entre tantas de minha memória cansada, quando, banhado pelo perfume quase inebriante da casa recém-limpa, na tradicional superfaxina da semana de Natal na casa de minha mãe, onde esta já terminava a farta e deliciosa ceia que eu já salivava, e revendo o fraquinho (porém saudoso) filme Papai Noel existe na TV, papai adentrava a sala com as últimas sacolas de compras da véspera da Grande Festa, no que lhe pergunto "O senhor trouxe?", ao que ele responde, com a praticidade que lhe é peculiar até hoje, "É essa?", jogando-me aquela maravilhosa revistinha no sofá, bem ao lado do lugar onde estava sentado.
Era 1990 e aquele era o primeiro relançamento de A Piada Mortal, clássica ‘graphic novel’ da genial dupla Allan Morre/Brian Bolland, sobre o maior encontro entre Batman e Coringa até então narrado. E eu, já encantado com aquelas figuras cheias de cores e embates sobre a loucura do maior vilão dos Quadrinhos naquele breve folhear, levantei a vista e agradeci "É essa mesma, pai, ’brigado!". Aquele foi um bom Natal para mim... Já para Batman, no meu viver daquelas páginas cheias de arte cinematográfica, aquele era um "Natal difícil" – embora a estória daquela HQ não se passasse nessa época do ano...
Nos Quadrinhos, poucas boas estórias narraram o Natal de grandes personagens – o que é um contra-senso, uma vez que comemoramos, ainda que ao menos num simbolismo genérico de paz e esperança quando a fé não permite, o nascimento de um superser... Fico a imaginar a dificuldade de um super-herói numa noite real de dia 24 de dezembro, a esperar pela chance de paz e realizações da meia-noite do dia 25... É verdade: Natal de um herói (ou uma heroína) não deve ser nada fácil...


Nem sempre o mundo é como desejamos... Mas saibamos agradecer a Deus pelos poderes inefáveis do dia-a-dia e pelas dádivas maravilhosas dignas de uma perfeita história de ficção: ainda que haja tanta kryptonita ao redor, nunca percamos nosso poder de voar, sonhar e de dizer para todos, mesmo para aqueles que não acreditam em milagres: feliz Natal – celebremos a vinda de um real salvador a este mundo já tão triste e cheio de ausências, ansioso por um milagre natalino ao longo do novo ano que se aproxima...
Eu me recordo, como em Amarcord, e as lembranças são sempre de dias felizes e, por isso, saudosos sempre... Agora, neste Natal, de fundo com a belíssima e saudosa trilha de Nino Rota, acompanho tudo de olho no mais novo embate entre Batman e Coringa em O Cavaleiro das Trevas: presentes de um herói com o peito cansado, mas com os olhos esperançosos olhando para o longe, em viagens distantes...

Até logo, 2008...