sábado, 31 de dezembro de 2016

Adeus, Estrelas...


Ontem e hoje: amor para além da vida... E das estrelas...

Eu começava a escrever o que seria a última postagem do ano (a anterior a esta, sobre Rogue One, Caça-Fantasmas, remakes reboots), quando soube que a querida atriz Carrie Fisher sofrera uma ataque cardíaco durante uma viagem de avião. Assustei-me, especialmente quando informaram que seu estado era grave... – Mas ela só tem 60 anos... – pensei – Ela haverá de se recuperar e voltar à ativa logo, logo... E, não negando as raízes, terminei meus pensamentos-preces com um – A Força é poderosa nessa jovem...  Restava uma esperança: afinal, ela era a mais jovem do elenco original de Guerra nas Estrelas, e somente os já idosos à época Peter Cushing (Grand Morf Tarking) e Sir. Alec Guiness (Obi-Wan Kenobi), juntamente a Kenny Baker (R2-D2, que sofreu um infarto em agosto deste ano), já faleceram – todo o restante do elenco, incluindo a voz e o corpo de Darth Vader (o ainda na ativa James Earl Jones e o já aposentado David Prowse, respectivamente), seguem firmes, apesar das idades já avançadas entre as casas dos 70 e 80 anos (a não ser pelo segundo mais jovem, o Mark "Luke Skywalker" Hamill, atualmente com seus 65)!

Infelizmente, para a minha dura surpresa, enquanto ainda escrevia a tal postagem – ficando longa, muitas ideais a concatenar, vou fazendo aos poucos... , leio na internet que a Carrie se fora... Sem brincadeira alguma, senti uma espécie de "distúrbio na Força", algo no peito me doía mais do que a perda de uma grande artista, de uma grande mulher (muito mais que a Princesa Leia, além de atriz, foi também uma grande escritora e ativista): talvez por ter sido tão representativa para toda uma geração nerd em nascimento nos longínquos anos 80, senti como se milhões de corações lamentassem juntos aquela perda... Mas também foi inevitável não pensar na sua igualmente famosa mãe, a grande atriz Debbie Reynolds: – Coitada da Debbie... Se já deve ser um pesadelo para uma mãe enterrar uma filha, o que dizer de alguém com mais de 80 anos... Porque o Cinema é mesmo assim: faz com que nos lembremos dos sentimentos de alguém como se fosse bem próximo, embora esse alguém jamais nos tenha visto do lado de cá da tela... 

E então, quando já pronto para publicar a superpostagem final do ano – 9 parágrafos; mesmo tão longa, acho que ficou bacana... , no dia seguinte, uma surpresa ainda mais dura e doída: Debbie falecera! E eu, igualmente fã das duas – da mãe, desde a primeira vez que vi Cantando na Chuva; da filha, desde que vi Guerra nas Estrelas (no tempo que ainda em se chamava assim, em 1988), fiquei duplamente chocado, especialmente depois de ter pensado sobre isso um dia antes – parece que Debbie, realmente, não aguentou ficar longe da filha amada e um AVC a levou (ou, de acordo com Todd Fisher, praticamente "uniu-se com a Força", simplesmente fechando os olhos e "desaparecendo" magicamente como a Estrela que sempre foi)... Não havia como não me lembrar de outra despedida dupla igualmente triste e cinematográfica, no caso, Federico Fellini e Giulietta Masina: ele, o cineasta de outro mundo, foi-se; ela, maior atriz e companheira da longa estrada, inconsolável, acompanhou-o alguns meses depois... Doeu, de verdade, ontem, assim como hoje: sigam em paz, Debbie e Carrie, o Cinema ficou muito mais triste sem suas alegrias...

E assim, ainda chateado com o "Jornalismo" que se fez em torno de tudo isso – como uns pontuais metidos a engraçadinhos, que, sem graça, sem momento, sem local e sem noção, fizeram "piada" ridícula e de mau gosto envolvendo personagens sagrados para tanta gente (enquanto o verdadeiro Chewbacca, Peter Mayhew, referiu-se a Carrie Fisher de maneira muito mais bonita, digna e poética) –, os Morcegos ganhavam ao invés de apenas uma postagem especial de fim de ano, duas: a sobre Rogue One (coincidentemente, a respeito do universo que Carrie marcou tanto, ao ponto de surgir "remoçada" ao final deste, que foi o "filme do ano"); e esta, de despedida, no finalzinho de um ano de tantas perdas para as Artes em Geral (Umberto Eco, David Bowie, Alan Rickman, Ettore Scola, Prince, George Michael, Rubén Aguirre, Anton Yelchin, Bud Spencer, Abbas Kiarostami, Garry Marshall, Gene Wilder, Kenny "R2-D2" Baker, lá fora; Cauby Peixoto, Elke Maravilha, Héctor Babenco, Guilherme Karan, Shaolin, Humberto Magnani, Domingos Montagner, Orival "Fofão" Pessini e Ferreira Gullar por aqui), nossa singela homenagem, em particular, a essas duas estrelas unidas, que voltaram quase juntas para o firmamento...


Carrie, Debbie e Kenny Baker, o ator anão que "interpretava" o robozinho R2-D2, alcançram as estrelas no triste 2016 para as Artes em Geral...

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Novo... De Novo?!

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O primeiro é uma nova história sobre um universo estabelecido e bastante familiar de velhas e novas gerações, diferentemente do seu predecessor do ano passado (mas, sucessor, na cronologia geral da saga), O Despertar da Força, meio remake, meio reboot da trilogia original... Já o segundo se encaixa bem na nova leva de recomeços de franquias um tanto quanto esquecidas pelo novo público, porém saudosas para os maiores de 35 anos...
Em resumo: vale tudo em nome da nostalgia!

R2-D2 e C3-PO e muitas outras participações especiais de personagens amados; conexões com todos os outros episódios da saga oficial; várias aparições de Darth Vader, no mais alto grau de sua maldade; o clássico tema de John Williams no igualmente clássico fechamento da história... Com todos esses ingredientes saudosistas bem embalados num bom filme de aventura, nada mais restava à plateia em que eu me encontrava que bater palmas ao final (teriam sido puxadas por mim?!): Rogue One - Uma História Star Wars, sem dúvida, é uma grande experiência para ser vivida no cinema por qualquer fã do universo de Guerra nas Estrelas, iniciado no já longínquo 1977 em que nasci... Na verdade, apesar de ser um spin-off (história com personagens derivados de um filme ou uma série), bem poderia ser considerado um belo e independente filme de ação-ficção por qualquer não-iniciado em SW  se bem que "não-iniciado" seja coisa quase impossível neste mercado do entretenimento atual, dominado por filmes, seriados, animações, games, brinquedos e um sem-número de outros produtos há muito tempo, sobre todos esses personagens de uma galáxia muito, muito distante...

Mas, passada a excitação inicial e já com certo distanciamento da "síndrome do relaxamento do final do ano" (aquele no qual um sujeito se entrega tão desesperadamente ao escapismo de um filme na tela grande depois de um ano de cansaços que chega a achar qualquer coisa a melhor obra-prima já realizada), os Morcegos retomam o questionamento que me atormentava desde os primeiros anúncios feitos pela Disney não somente sobre este, como também sobre todas as vindouras histórias paralelas do novo universo expandido Star Wars no Cinema, a serem lançados entre os capítulos oficiais da saga (o próximo será Han Solo, em 2018, depois do Episódio VIII, previsto para o ano que vem): seria Rogue One uma mera proposta caça-níqueis da Casa do Mickey Mouse? Afinal de contas, boa parte dos filmes de super-heróis de lá andam bem saturados em inúmeras superproduções engraçadinhas e excessivas desde que o estúdio comprou a Marvel...

- Sou um androide, mas meu personagem é melhor que o seu...
Não, eu estava redondamente enganado: desde as preciosas respostas finalmente dadas a furos gigantescos da saga original  como a pergunta que, pelo menos pra mim, nunca quis calar: "por que a Estrela da Morte tinha um falha tão gigantesca que torna possível sua própria destruição?"  até as interessantes expansões nas exposições de personagens tão caros aos fãs  como o próprio Vader, que aparece, pela primeira vez, no seu castelo do vulcânico planeta Mustafar (sim, o mesmo do supervalorizado duelo final de Episódio III - A Vingança dos Siths) –, Rogue One é muito bem montado e o roteiro, ótimo, com uma estória bem amarrada entre antigos personagens (como a senadora rebelde Mon Mothma) e novos, porém muito críveis heróis  em especial, um pacifista cego "guardião da Força" e seu parceiro atirador, bem como o excelente e sarcástico K2-SO, mantendo o humor e a tradição dos inesquecíveis robôs SW, todos em meio à suicida missão de obter, para a Aliança Rebelde, os planos da mais poderosa arma do Império (então recém-construída e em fase de testes)  mote que inicia a trama de A Única Esperança 

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Starkiller Deathstar.: qualquer semelhança...
Apesar de não emplacar a heroína (Felicity Jones) tal como conseguiram, no ano passado, com a inesquecível Rey (Daisy Ridley), e de algumas sequências "feitas-para-fãs" um tanto quando exageradas ou desnecessárias (como a sanguinária sequência final), o novo filme consegue ser mais criativo, tanto em viradas na trama quanto no ótimo design de novas naves e criaturas, que o recente Star Wars - Episódio VII - O Despertar da Força – curiosamente, também a nossa última postagem do ano passado! Claro que nenhum fã que se preze vai desmerecer o Episódio VII, mas de se lembrar o pesado número de críticas à época do seu lançamento por causa do excesso de "semelhanças" com o primeiro Guerra nas Estrelas  naves idênticas (agora, em preto!) e quase idêntico leit-motiv (jovem habitante de deserto embarca em aventura espacial por causa de androide; rebelião contra falha em "planeta-arma-de-destruição"; holograma de um deformado ditador comanda vilão mascarado vestido de preto etc.)... E tudo porque, em vez da nova sequência esperada, tudo mais pareceu uma mistura de remake, ou refilmagem, dos Episódios IV e V com um reboot, a reiniciar novas histórias a partir de tramas similares às originais! 

De qualquer forma, refilmagens não são novidade alguma em Hollywood  e, apesar de recentes produções insossas terem tentado em vão "atualizar" pequenas obras-primas oitentistas, como dois famosos clássicos de Paul Verhoeven, Robocop e O Vingador do Futuro que não renderam lá grandes coisas (infelizmente, Padilha...), a lista de grandes releituras, de diferentes épocas, como Enigma do Outro Mundo, Invasores de Corpos, A Pequena Loja dos Horrores, 11 Homens e Um Segredo e O Chamado, é maior e mais lucrativa que o número de fracassos, aqueles do tipo sobre o qual qualquer cinéfilo de bom senso se questiona: Por que refilmar esse clássico?!... Ou, noutras palavras: pra que diabos fazer, de novo, Ben-Hur, por exemplo, se o clássico de 1959, com o grande Charlton Heston, já era uma refilmagem genial (de um original de 1923)?! Pois é... Fizeram! Obviamente que os Morcegos nem quiseram tomar conhecimento deste fiasco (que, infelizmente, contou com o Santoro, que insiste em fazer blockbusters ruins, numa participação como Jesus Cristo)!

Talvez por derrapadas como essa ou, simplesmente, por visar novas continuações para o público mais jovem (habituado a chamar de "antigo" qualquer filme com menos de 10 anos produzido), mas sem esquecer os mais velhos, ávidos pela nostalgia de rever "coisas de sua época" na tela, é que a moda atual sejam os reboots, espécies de "refilmagens-reinícios": novos filmes, com novos elementos e personagens, no entanto com influência direta (ou mesmo trechos idênticos de roteiro e muitas cenas similares "homenageadas") da trama original  como visto nos hoje praticamente esquecidos Superman - O Retorno e Predadores, ou nos recentes e bem-sucedidos Jurassic World Creed (que quase deu um Oscar a Stallone, por reviver Rocky neste recomeço da velha franquia de boxe, agora com o filho de Apollo)! Entretanto, apesar destas citadas fórmulas de sucesso, reboots também podem ser arriscados  a franquia Exterminador do Futuro que o diga... E, mais recentemente, o "polêmico" Caça-Fantasmas!
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A primeira vez continua num hotel...
Só que em meio a um show de rock
Sim, polêmico por inúmeras razões além da óbvia ideia de refilmar algo considerado irretocável pelas memórias de 9 entre 10 aficionados nerds com infância nos anos 80: elenco feminino no lugar do masculino; diretor e atriz principal famosos por comédias-besteirol ou de gosto duvidoso (vide a "clássica" cena do piriri no banheiro de Missão: Madrinhas de Casamento, de Paul Feig e com Melissa MacCarthy no elenco)  enfim, querer mexer, simplesmente, numa das melhores comédias de ficção de todos os tempos e com tantos subprodutos icônicos (animações, brinquedos...)! Mas, por mais incrível que possa parecer, o filme não é de todo ruim  e falo isso como um expert do original de 1984 (que vi, pela primeira vez, em 89): o elenco principal é bom e engraçado e atualiza bem o ritmo do humor de interação entre os caça-fantasmas, sem ninguém querer substituir os antigos protagonistas em meras versões femininas de Egon (Harold Ramis, a quem o filme foi dedicado, homenageado por meio de um busto, numa faculdade), Ray (Dan Ayckroyd, corroteirista com Ramis do original e produtor executivo do novo filme, participando, rapidamente, como um taxista), Peter (Bill Murray, que aparece agora como um cientista caçador de farsas) e Winston (Ernie Hudson, que fecha a nova produção como o tio da sua "substituta", a ótima comediante negra Leslie Jones, do Saturday Night Live); o roteiro não fica adstrito a somente misturar as tramas de Ghostbusters (84: origem do grupo; perigo gigante que ameaça NY; interferência do prefeito) e Ghostbusters II (89: gosma e portais subterrâneos), como também costura tudo com certa criatividade numa nova trama... Mas, então, o que deu errado?
Tinha que ter o Geleia...

Pra começar, o excessivo número de referências à história do primeiro Os Caça-Fantasmas ajuda bastante a prejudicar o andamento, soando cansativo depois da metade do filme  que, logo após algumas situações forçadas (prefeito onisciente; possessões e poderes sobre coreografias coletivas; personagens que somem da trama...), é justamente quando o reboot passa a expor suas maiores falhas até o clímax extremamente ruim... Sim, o que mais estraga essa nova produção é o desenrolar e a longa sequência final: sem graça, over e sem sentido algum (especialmente pelo fraco vilão, que, de repente, iguala-se em poderes ao original Gozer só para justificar a aparição de um fantasminha gigante similar ao já icônico Stay Puft  que também aparece!), tudo é extremamente cansativo em ação e efeitos... Como se toda produção atual, ainda que uma comédia de fantasia/ficção, tivesse que virar filme-de-super-herói (ou, no caso, heroína) para crianças, com tudo azul e verde e cheio de coreografia! Assim, com tantos atropelos, as boas intenções do diretor seguem direto, literalmente, para o Inferno, ao ponto de os fãs mais empedernidos (como este humilde escriba) se arrependerem da condescendência inicial e passar ao velho questionamento, de novo: "Se o original era tão bom, pra que diabos refazê-lo?!"... 

Infelizmente, fica mesmo a sensação (em casa, acompanhando por download via torrent) de que não precisávamos de um novo começo para os hilários investigadores do paranormal, sensação incômoda bastante parecida a ter visto toda a nova primeira trilogia "tal como George Lucas imaginara", mas preferir, disparado, os Episódios IV, V e VI, a "Santíssima Trindade" das trilogias de grandes sagas, desejando ter ficado só na imaginação sobre como Anakin se tornara Darth Vader... Bom, isso até hoje, quando, mesmo sabendo bastante da trama e, o que é pior, como ela acaba, ainda foi tão adorável morder a língua ao ver, na telona, que Rogue One era tão bom (e, rever Vader, melhor ainda)  decididamente, remakes, reboots e afins não são pra todo mundo! Tem que ter a manha... Ou a Força!

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À sua escolha: quem vocês vão chamar?

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Pelas esquinas a gente ainda há de se cruzar e ficar cara a cara...

Paisagem de Paris, 1959, Hajime Higaki.


Finados

E a vida segue
à espera da sorte
de se encontrar na esquina
de se esperar a morte
na correria,
no átimo de cada coisa dita
ou esquecida,
como os amores perdidos
somente sentidos
entre um gole e outro
antes do ocaso ébrio
diante de um Chico na vitrola
que nem mais ouço,
que nem mais leio,
que não dá tempo,
que nem tenho absoluta certeza
sobre o que rola
ladeira abaixo
com ela, com as outras
letras que me esperam,
na incerteza de amar a fundo
ou de querer só desejar
diante da tela clara
de um cinema vazio
que nunca começa,
que quase nunca visito...
só sei que tudo um dia se encontra
e enfim se cruza
o começo com o fim,
no que se tinha pra fazer,
mas que agora não tem razão
porque o feriado é morto
e a cabeça
a chegar ao rabo
fecha o ciclo de um tempo de cão
que nunca teve quê nem porquê,
só seguiu sua sina
antes mesmo de dobrar a esquina
e de encerrar o que tanto prometia
diante da tela clara
a ser preenchida
branca, vazia,
cheia de mais imprecisão...

(Dilberto L. Rosa, 02 de novembro de 2016)


terça-feira, 18 de outubro de 2016

Lembranças de Crianças

Costumo dizer que me mantenho jovem por meio das minhas lembranças - e algumas pessoas, dentro dessas memórias, carregam mais lembranças minhas que outras... Acho que por isso eu escrevo, para fixá-las nalgum lugar, antes que eu as perca - ou melhor, que eu me perca... Por isso é tão bom revê-las a qualquer hora, em qualquer lugar - assim eu não envelheço nunca...

Uma dessas queridas é Mariana, adoro cruzar com Mariana - porque não há santa vez que eu não a veja que eu não me lembre de duas coisas fortemente ligadas à infância... Primeiramente, impossível não cantar Mariana conta uuum, Mariana conta um - é um, é um: Ana, viva Mariana, viva Mariaaana! O que indissociavelmente me traz a infância de minha Rainha Isabela, primogênita do meu coração, que aprendeu a contar com essa canção nos vídeos da Galinha Pintadinha.

A outra razão é uma crônica pronta - na verdade, semipronta, porque ficou sem final até bem pouco tempo... História de infância, que vivemos juntos no Dom Bosco do Centro, pelos idos da 6.ª série, ela da 61 e eu, 63, na "sala do alto" e ao lado da biblioteca "fantasmagórica", todos na famosa região do "Barracão", da imensa caramboleira e do universo paralelo que nos protegia dos mais velhos - éramos os mais jovens do turno vespertino e havia mesmo um portão gradeado branco, como que nos separando do resto da escola (ou do mundo infantil...), até com uma saída própria, só que nunca utilizada.

Estabelecido o idílico cenário, eis o introito da trama: começávamos aquele delicioso 1989 de minhas melhores reminiscências, o último ano de nossa infância, e estava no auge um álbum de figurinhas de um filme maravilhoso, Uma Cilada para Roger Rabbit, meio infantil, meio comédia policial, porque misto de homenagem aos filmes noir e às antigas animações à lá Looney Tunes, sucesso absoluto com a meninada da época. Álbum avançado em páginas completas de figurinhas, o difícil era conseguir as especiais, menores e fofinhas, geralmente com um personagem em destaque - e que, além de preencher o álbum, ainda ficavam lindas na capa de um caderno ou agenda!

E eis que, nem tenho tempo para comemorar o primeiro adesivo fofinho que encontrei com o famoso coelho do Cinema, tendo rasgado o último dos vários pacotinhos de repetidas que acabara de abrir num cantinho da sala e dou de cara com Mariana - deveria ter ido visitar uma das meninas... Entrosada essa Mariana: nem pediu licença e foi logo pegando da minha mão aquele macio trofeuzinho - Dilberto, que legal... Nunca tinha visto um desses... Me dá?! - Claro que não, Mariana: é a primeira vez que encontro um também!... Adiantou alguma coisa? Acreditem ou não, ela simplesmente pegou da minha mão e saiu correndo!

Ainda corri atrás, mas Mariana havia sumido e, logo em seguida, o barulhão da sirene anunciava que já era 1:20 h e começaria o primeiro horário... No recreio ela continuou foragida, só me restando recorrer à temível Tia Silvia, nossa coordenadora pedagógica e disciplinar da cara mais fechada, sempre surgindo de sua soturna salinha do Barracão para aplicar os devidos corretivos nos alunos incautos - Agora Mariana ia ver uma coisa...

No dia seguinte, ainda vi a pequena meliante ao longe - e, no que ela me viu, entrou correndo na 61! No que vou avançando em sua direção, sou interrompido por Tia Silvia, que, quase em tom sepulcral, tratou de me atualizar das suas diligências em perseguição à pequena ladra de raros adesivos alheios - Falei com Mariana: ela pediu desculpas, mas disse que não podia mais devolver o adesivo porque já havia colado no caderno e rasgaria se ela arrancasse...

Genial: que argumentação! Deveria ser advogada essa menina... E era só isso?! Aquela criminosa ficaria impune? Nem a poderosa e cruel coordenadora faria Justiça e me vingaria? Aquele era um duro marco, o fim da época da inocência e o triunfo da desfaçatez! Só me restava buscar, noutro pacote repleto de figurinhas já repetidas, um novo adesivo fofinho... Mas não me lembro mais de nada desse episódio - nem se achei outra figurinha fofinha igual ou comparável, nem se vi ou falei com Mariana naquele ano, tamanha a minha raiva que a sensação restante foi de bloqueio... Porém, depois de anos, vendo Mariana em qualquer lugar, a lembrança que instantaneamente surgia era esse caso - Mariana conta um... Sim, conta um adesivo FURTADO!

E a primeira vez que a vi novamente, depois de tantos anos - teria visto antes? Não sei dizer por causa do bloqueio traumático da impotência diante daquela injustiça... -, foi no meu universo jurídico: casada com um servidor de uma Vara em que possuía algumas ações no Fórum, por lá nos encontramos e conversamos um pouco, soube que era odontóloga, mas tanto nessa quanto em qualquer outra vez que a reveria, jamais a lembrei da lembrança que ela me trazia... Da infância guardada e liberada toda santa vez que a via...

Sim, porque aquilo foi coisa de criança... Criança má, levada e com tendências criminosas, sem um pingo de consideração com coleguinhas que lutam para completar um álbum de figurinhas, mas era coisa de criança... O mais engraçado disso tudo, porém, nem foi toda essa curiosa lembrança - ou a lembrança infantil que Mariana sempre me traz quando a vejo -, mas, sim, a surpresa em torno de um de nossos últimos encontros...

Estava eu dando uma aula sexta à noite, alunos entediados pelo dia e pela hora (jamais pela minha aula!), no que vejo Mariana pela janelinha de vidro da porta, passando pelo corredor - no que ela me vê e me pede com os olhos alegres para dar um "oi" lá fora! Atendo-a prontamente, pedindo breve licença à turma - abraço-a, sorrisos, quiproquós ligeiros e, fico descobrindo que ela também tem gêmeos... Mais sorrisos rápidos, já sabia que ela era odontóloga e professora da Instituição, no que ela me surpreende dizendo que vai seguir para a sua aula - De quê?, eu pergunto - De Direito!...

Nada mais me surpreende! E rio internamente, segundos depois da despedida, voltando para a aula - Que loucura: depois de Odontologia, ela agora faz Direito... Nem o melhor cronista preveria esse irônico final para aquela crônica pronta: começou a menina mais doce, flertou com o mundo do crime e, após tantos anos e realização profissional em área completamente diferente, será... advogada!... Sim, agora ela estava no caminho profissional correto! Não havia como não pensar num sem número de clássicas piadas folclóricas com advogados, minha própria classe - assim como não há como não lembrar a infância revendo uma amiga de tão simpáticas e surpreendentes reviravoltas!

domingo, 11 de setembro de 2016

Uma Simples Canção Genial Demais...


Noutro dia, encontrando uma brecha na agenda sempre corrida, eis que consegui visitar as boas, velhas e bagunçadas Lojas Americanas de longa data, da época de adolescente, como rato que eu era de CDs, DVDs e livros (alguns deles feitos "brindes" mesmo, tempos pré-Direito, sacomé...) - e, nos poucos minutos em que por lá fiquei, consegui me atualizar entre os lançamentos de colecionáveis, brinquedos, livros, Quadrinhos, filmes e discos. E eis que, "de repente, não mais que de repente", como no famoso soneto do Poetinha, encontrei algo que me fez voltar ao passado ainda mais, por inúmeras razões... Tratava-se do clássico Canção do Amor Demais, espécie de disco de apresentação da "Santíssima Trindade" que consolidaria a Bossa Nova como "gênero brasileiro de exportação": João Gilberto, com sua revolucionária e definidora batida peculiar ao violão, fundindo-se ao lirismo dos belíssimos arranjos e melodias de Tom Jobim e da Poesia popular, porém profunda, do "poeta e diplomata" Vinícius de Moraes.

Mas minha viagem no tempo nem foi tanto pelo saudosismo em relação às tão famosas interpretações da "Divina" Elizete Cardoso naquela obra tão cultuada da MPB - sigla que, entretanto, só seria lançada, de fato, anos depois, em meados dos anos 60, já com o fim da Bossa Nova. Na verdade, além de eu jamais ter ouvido antes esse disco, imortalizado na própria obra da dupla Tom e Vinícius no clássico Carta ao Tom 74 ("Rua Nascimento Silva, 107/ Você ensinando pra Elizete/ As canções de Canção do Amor Demais"), a alegria saudosista foi mesmo por ter encontrado esse clássico disco naqueles moldes de "edição popular informativa", no caso, uma produção do jornal A Folha de São Paulo, que, algum tempo atrás, poderia ser comprado junto ou em separado às edições de domingo daquele jornal - o que, por sua vez, em muito me lembrava dos meus tempos áureos de descoberta da Música brasileira, do início de minha juventude, quando várias de minhas coletâneas e discos clássicos, que possuo até hoje, de gênios como Djavan, Noel, Adoniran e Cartola, eram vendidas nas mesmas Americanas por preços promocionais, advindas de encartes similares de bancas e livrarias!

Obviamente que nem pestanejei e comprei, no ato, para já ouvir no carro e viajar um pouco na volta para a dura vida cotidiana - mas qual não foi a minha surpresa quando aquele disco (ouça-o, na íntegra, aqui), tão almejado por qualquer simples colecionador como eu e tido como divisor de águas na década de 50, acabou por se mostrar como extremamente datado e enfraquecido pelo tempo?! Pois é: mesmo sendo o début do então vice-cônsul do Itamaraty Vinícius na Música brasileira e contando com, além da primeira reunião oficial daquele genial triunvirato, a inigualável voz da Divina nas primeiras gravações de obras-primas absolutas como Serenata do Adeus e Chega de Saudade, não dá para dizer que seja este o "marco-zero" da Bossa Nova - que se daria, verdadeiramente, com o LP Chega de Saudade, de João Gilberto, alguns meses depois, já em 1959... Tampouco era possível não perceber o tom "pesado" do disco, seja porque João não teve total liberdade para desfilar a leveza da sua genialidade (sua pequena participação nem foi creditada na primeira edição deste disco), seja pela escolha do repertório (pouca bossa e mais sambas-canção ou modinhas em tom de valsa), seja ainda pelo estilo de Elizete, que, talvez por não ter dado ouvidos às dicas do mestre Gilberto, acabou trazendo uma interpretação mais "bolerão" para canções que exigiam sutileza, como a "já-nascida clássica" Eu não existo sem você - que tão bem melhor se elevaria, décadas depois, na sublime voz de Maria Bethânia.

E é justamente essa canção que, creio, define a genialidade aparentemente simples do que viria a ser a Bossa Nova - basicamente alicerçada pela dupla de seus compositores maiores, Tom e Vinícius: se, nos primeiros versos, resta a aparente ingenuidade da maioria das composições desse período - Eu sei e você sabe já que a vida quis assim/ Que nada nesse mundo levará você de mim -, logo em seguida a Poesia do grande Poetinha nos dá uma analogia demolidora - Que todo grande amor só é bem grande se for triste... E, mesmo com algum jogo de palavras somente divertido - Que todos os caminhos me encaminham pra você -, segue-se um conjunto inigualável de analogias poéticas que, mesmo simplistas, são belíssimas e coisa de raros compositores - Assim como o oceano só é belo com o luar/ Assim como a canção só tem razão se se cantar/ Assim como uma nuvem só acontece se chover/ Assim como o poeta só é grande se sofrer - até o arrebatamento que dá título a essa pequena obra-prima - Assim como viver sem ter amor não é viver/ Não há você sem mim/ Eu não existo sem você (tal qual o "Porque era ela/ Porque era eu" de outro gênio, o Chico Buarque - adaptando a já clássica manifestação de Montaigne)... Assim como Caymmi, outro gigante da simplicidade de clássicos como O Bem do Mar, Vinícius igualmente "fez" isso, simples e genialmente - e tudo "de repente, não mais que de repente"... Para o mais simples deleite de alguém que se deixa maravilhar com a simplicidade de lembranças como a das primeiras descobertas musicais na adolescência...

domingo, 31 de julho de 2016

'Tá rindo do quê?!
De Jô a Gentili: a tradição preconceituosa e rasteira do Humor brasileiro...

Apesar de ter procurado manter-se longe das polêmicas desde o famoso incidente com uma piada infeliz sobre o filho de uma cantora famosa, o humorista Rafinha Bastos jamais se livrou por completo do estigma que acompanha o "Novo Humor" desta geração - que parece somente emular, só que com mais grosseria, os mesmos preconceitos e baixarias de sempre: em seu recente programa no Multishow, Tá rindo do quê?, Rafinha, acompanhado de convidados, segue a mostrar que, ao menos em seus shows, ainda aposta nas piadas ofensivas contra pobres, "feios" e pontos periféricos das cidades em que se apresenta...  

Depois de um cansativo dia de trabalho, muitas vezes tudo o que se pede é um bom canal na televisão para se desligar dos problemas, de forma extasiada, até o dia seguinte, certo? Porém, diante do nada farto cabedal de opções nas grades de programações, tanto faz se na rede aberta ou na paga, parece que um dos últimos recursos nesta busca por um "desligamento de qualidade", atualmente, seja mesmo o escapismo saudosista por programas antigos, numa derradeira e nostálgica saída para se distrair com os "bons tempos que não voltam mais" - afinal, tudo, inclusive televisão, "era muito melhor nessa época"... Será mesmo?

Recorrendo a um desses canais que reciclam suas produções, como o já famoso Viva, do Império (do Mal) Global, atualizei-me com a programação (coisa que normalmente não faço: por absoluta falta de tempo, só me resta zapear a esmo quando defronte da TV) e voilá: aquela noite parecia bastante promissora! Primeiramente, Viva o Gordo: ah, que maravilha seria rever o Jô em seus tempos áureos ("pam-pam-pam-pam pampampam": a empolgação já começava com a divertida abertura, com o comediante interagindo com personalidades mundiais ao som do tema "roubado" de Hello, Dolly!), quando eu o via às segundas, mesmo sem entender algumas sátiras políticas e ironias maliciosas do alto dos meus 7 ou 8 anos! Só que não: o cansativo formato de personagens e quadros com jargões que então criavam moda já incomoda, pela falta de graça, nos primeiros minutos... Entretanto, muito mais do que pelo humor envelhecido, a triste constatação da rápida proliferação de piadas pejorativas, racistas ou misóginas - que, na época, passavam despercebidas, talvez porque ninguém discutia racismo ou machismo naqueles tempos "inocentes" daquele nosso "Brasil sem preconceito" -, em pouquíssimos minutos de re-exibição, passou a incomodar muito mais!

Primeiramente, nenhum negro no elenco (o mais "mulato" era o Eliezer Motta) e um incômodo "complexo de vira-lata" no último grau dominando a maioria dos quadros (algumas vezes justificável, já que o ano era da "retomada democrática" pós-Ditadura Militar); aqui e ali, várias piadinhas grosseiras com pobres e favelados; belas mulheres em exibição - incluindo uma ainda bela Sandra Bréa -, sem fala alguma ou a repetir piadinhas em que se mostram ora como interesseiras, ora como burras e mero objeto sexual (formato até hoje repetido por um dos últimos humorísticos jurássicos da televisão, A Praça É Nossa)... Mas o terror do "humor misógino", e mesmo criminoso, viria em seguida: aquele dentista do famoso bordão "Bocão!", com investidas nada sutis em cima de suas pobres pacientes, começava agora o já absurdo e abusivo esquete "fazendo graça" (com direito àqueles irritantes risos da claque) de um... estupro! Sim, isso mesmo: uma moça acordava seminua (calcinha fio dental, sutiã e meias pretas) na cadeira rebaixada daquele dentista se perguntando o que fazia ali, daquele jeito, e o personagem vivido pelo Jô tinha a pachorra de declarar que se valeu da anestesia (!) e que o tal "bocão" da mulher "havia sido uma loucura (!!), no que ainda marcava, com "hilário" jeito de tarado, para "repetirem a dose na semana que vem" (!!!) - Jesus, em que universo um estupro de vulnerável (abuso sexual de uma mulher dopada) é divertido?! Só se for no do Abdelmassih!

Mas "calma, calma, que, de acordo com o guia aqui, logo depois virá a TV Pirata e aquele pessoal genial redimirá esse humor reacionário e preconceituoso do Jô Soares", dizia eu para mim mesmo, com esperança de não ter perdido completamente aquela noite tão almejada em salvação pela nostalgia televisiva! Só que não: muito daquele precursor programa brasileiro parecia bastante datado no besteirol oitentista e envelhecido pelos quase 30 anos que me separavam daquelas hilárias terçar-feiras repletas da criatividade de gente do calibre de Luís Fernando Veríssimo, Laerte, Patrícia Travassos, Luís Fernando Guimarães, Cristina Pereira e o recentemente falecido Guilherme Karan, só para citar alguns dos brilhantes nomes da redação e do elenco incríveis...

Ainda assim, aqui e ali ainda era possível rir bem mais que o ultrapassado e repleto de preconceitos "humor" que a turma do velho Max Nunes e cia. faziam no humorístico do Jô (gentes que tão bem já haviam criado na rádio e na televisão, mas que, nos anos 80, já se mostravam desgastados)! "Tudo muito bom, tudo muito bem", até que... Surge na tela uma cena de blackface, prática deplorável dos tempos do vaudeville norte-americano, que consistia em ridicularizar negros pintando atores brancos de preto e fazendo-os agirem com atitudes exageradas ou idiotizadas! Pois é: também não havia atores negros na TV Pirata e, pelo que me lembrei na hora, era muito comum, naquela época, esse lamentável recurso "cômico", geralmente disseminando preconceitos como quando surgia uma Regina Casé de "mãe de santo preta velha", com seus "hum-hum" e "misifios" ou um Diogo Vilela dizendo que "negro gosta de pagode", tudo com direito a muito olho esbugalhado e gingados macaqueados, como se negros vivessem a dançar ou a se balançar freneticamente...

Não adianta fugir ou querer se enganar: humor ruim e preconceituoso sempre existiu, faz parte da cultura do patriarcado brasileiro, que, desde os tempos da nossa básica formação casa grande/senzala, parece querer justificar que o dominador faça troça do dominado e, consequentemente, "inferior" - é tão comum e popular no inconsciente coletivo que vem sendo aceito, há séculos, pela ampla maioria dos próprios ofendidos, grupos-alvos como os dos negros, das mulheres, dos homossexuais, que normalmente sempre riram de ataques preconceituosos a eles próprios! Consciente desta triste sina e já bastante desanimado, aceitei, por fim, dar uma olhada no derradeiro programa da noite: A Escolinha do Professor Raimundo, já numa de suas últimas edições globais - e, portanto, sem o brilhantismo de medalhões como os então já falecidos Walter d'Ávila e Brandão Filho -, de cara, já me fazia questionar a idolatria que sempre sentira pelo genial Chico Anysio, com uma esquete dentro daquela atração com piadas absurdas sobre violência doméstica naqueles tempos pré-Lei Maria da Penha: a boa comediante Nádia Carvalho, vivendo a personagem Santinha Pureza, "brincava" com as "mulheres que gostam de apanhar", e, após narrar nada cômicos casos em que era constantemente agredida ou explorada pelo marido violento em serviços pesados, vinha com o bordão "Eu góstio" - ou seja: não lhe sendo suficiente fazer apologia à "mulher de bandido" que não se dá valor, de quebra conseguia debochar do "jeito errado de falar" do nordestino (a personagem dançava e cantava um xaxado para "espantar os olhos invejosos")!

Que falta sempre fez um pouco de bom senso no Humor brasileiro - e um tantinho que fosse de um mantra a ser repetido à exaustão por qualquer um que queira ser engraçado de verdade não faria mal a ninguém: "Ria do opressor; jamais do oprimido", como no bom dizer do grande Gregório Duvivier, excelente humorista do bem-sucedido Porta dos Fundos e um dos maiores expoentes de uma geração mais consciente - que conta, ainda, com gente bacana com Marcelo Adnet, que, em seu recente e elogiável Tá no ar, vive um "revolucionário pirata de esquerda" e, roubando o sinal televisivo da Globo, critica tudo e todos relacionados à opressão daquela emissora - de que algo deve ser mudado em relação a esse deboche contra quem sempre foi saco de pancadas... Graças a Deus, aqueles que os defensores desse cruel "humor que não ofende" chamam de "patrulha do politicamente correto" (e eu chamo de "questionadores conscientes") têm levantado bandeiras e feito barulho a cada "piadinha inocente" sobre "pretos" inferiores, mulheres burras ou objeto sexual e "bichinhas" que gostam de apanhar ou ser estupradas, conclamando não só os ofendidos de tanto tempo a ficarem espertos e não tolerar mais o avanço de tamanhos preconceitos instituídos como "normais", como também têm gerado um crescente movimento de conscientização na sociedade como um todo, que passou a prestar atenção que, sim, há limite para o Humor: ele deve ser engraçado! E, definitivamente, não há graça nenhuma,, em plena segunda metade da segunda década do século XXI, comparar um negro, até hoje discriminado socialmente, a um macaco comedor de bananas... Deixemos, pois, gentes como os Gentilis da atualidade presos em seus próprios zoológicos sem graça até descobrirem que talento na nobre arte de fazer rir é para poucos que sabem criar sem ofender ninguém!


Em retrospecto, a Televisão nos mostra que isso é velho, mas, infelizmente, ainda não ultrapassado, dado que muitos são os seguidores destas velhas práticas "de fazer rir"... Danilo Gentili, pouco tempo após a famosa "pérola" racista contra os judeus (até quando tentou fazer crítica social aos preconceituosos moradores de um tradicional bairro paulista, ofendeu - no caso, as vítimas do Holocausto: "Entendo os velhos de Higienópolis temerem o metrô. A última vez que eles chegaram perto de um vagão foram parar em Auschwitz"), redirecionou o seu "humor" para os negros: comparando-os a macacos ("original"...), ofereceu bananas a um empresário negro que o confrontou no Twitter... Sério, Danilo: isso é o que você chama de engraçado?!

domingo, 26 de junho de 2016

Lembro-me de Bethânia há uns 70 anos...

Eu me lembro dela quando ouvia, na casa de meu amado avô Sebastião, Maria Bethânia, clássico de Capiba na voz do maior cantor brasileiro (de todos os tempos), Nelson Gonçalves - "Maria Bethânia,/ te lembras ainda daquele São João?/ As tuas palavras caíam bem dentro do meu coração.../ Tu me olhavas com emoção e, sem querer,/ pus minha mão em tua mão" - e me perguntava se era verdadeira aquela história que vovô contava, sempre que ouvíamos juntos essa canção na sua radiola, sobre o fato de aquela grande cantora ter esse mesmo nome porque seu irmão mais velho, Caetano Veloso, adorava essa música... Muito tempo depois (meu avô amigo, inclusive, já havia partido), enquanto assistia, sozinho, ao vídeo-documentário Circuladô Vivo, eu descobri, no relato nostálgico do próprio Caetano, que, sim, como ardoroso fã dos antigos sucessos da rádio que a sua mãe, Dona Canô, cantava-lhe sempre, foi ele quem sugeriu o nome do clássico para batizar a irmãzinha que estava para chegar, naquele predestinadamente glorioso ano da graça de Iansã de 1946...

Eu me lembro dela quando, numa de minhas loucas e alucinadas caçadas a grandes LPs nas casas dos amigos, daquelas para gravar várias fitas K-7 com as melhores coletâneas da nata da MPB, do Jazz, da Bossa Nova e das Big Bands recém-descobertas de então, no começo da década de 90 dos meados de minha adolescência, achei o disco dela - na verdade, não era bem "dela", mas com o melhor das suas canções de até então: Simplesmente O Melhor de Maria Bethânia. Aquela coletânea histórica, naquele disco histórico da Philips... Simplesmente Explode Coração, Grito de Alerta, Negue, Coração Ateu, Brincar de Viver, Minha História, Sonho Impossível, Ronda, Atiraste uma pedra, Olhos nos Olhos, Álibi, Um jeito estúpido de amar e aquela que me deixaria boquiaberto com tanto "erotismo explícito", Mel: "É meio-dia, é meia-noite,/ é toda-hora/ Lambe olhos, torce cabelos/ Feiticeira, vamos embora"... Muito tempo depois, numa entrevista de Wally Salomão de pouco tempo antes de morrer (foi-se cedo o versátil artista), é que fui descobrir que o genialmente ardiloso poeta estava falando, na verdade, de várias espécies brasileiras de abelhas - tudo doce e simbólico como a própria Bethânia!


E eu me lembro dela porque, falando em fita k-7, minha mãe me incumbiu de gravar, certa feita, aquele seu mais novo trabalho da época, então uma coqueluche de críticas derramadas por sobre aquelas reinterpretações de alguns dos mais famosos clássicos da dupla Roberto e Erasmo - eu até gostava de ouvir quando meus pais tocavam Roberto Carlos em casa, mas daí a me tirar de uma brincadeira, aos 16 anos, na piscina na casa do meu tio, para aquela bendita gravação do CD recém-comprado pelos meus familiares... Recolhido no silêncio do quarto do som, tornei-me instantaneamente um fã ardoroso da obra de Roberto e Erasmo a partir de então por causa dela - especialmente depois daqueles incríveis acordes de violoncelos, como que a "narrar" uma fuga, na introdução daquela que eu antes achava tão brega, Fera Ferida, mas que, com ela, entrando e se imiscuindo por entre aqueles melódicos contra-baixos com o seu rompante "Acabei com tudo..." - ah, As canções que você fez pra mim: aquilo era de outro mundo! Sim, os arranjos eram belíssimos e tão arrojados quanto clássicos, mas... Aquela voz...

Voz tamanha, que me lembro do assombro de todos quando do anúncio de que ela gravaria Zezé diCamargo e Luciano - blasfêmia, permitir a santa sujar seu timbre com o profano brega que ninguém mais aguentava ouvir naqueles "sertanejos" anos 90 (que das clássicas modas de viola, como a moderna Tocando em frente, que ela mesma já havia imortalizado, tinha tão pouco)?! Mas o que dizer do resultado final? "É o amor..."! Ficou lindo, ficou lindo, e eu me rindo de cantar, pela primeira (e última vez), um agora clássico de Mirosmar José de Camargo (haveria outras breguices no mesmo estilo anos depois, que também ficariam belas, mas esquecíveis)! Não resta dúvida, ela tem esse dom arrebatador, de quebrar paradigmas: lembro-me, por exemplo, de tantas as especulações de sempre sobre sua sexualidade (sexo dos anjos? Dos deuses?), no que ela irrompeu, por fim, e rebateu com uma famosa entrevista na Playboy de 96: - Quando eu amo, pode ser qualquer coisa: homem, mulher, bicho... Tolices diante da rainha: sim, uma rainha, inclusive com incômodos momentos de famosos pitis nervosos, de não ser facilmente agradada, de ser dura em entrevista, de largar show com pouco tempo de apresentação... Mas faz parte do seu show...

Eu sempre me lembro de seu Álibi perfeito como a primeira mulher a mais vender discos neste País masculinizado ao pensar em voz forte e femininamente grave e meio soprana, porque ela, a dona da voz, é precisa, perfeita e cheia de opinião desde o canto alto da ira social lancinante de um Carcará até os arroubos de candura e introspecção dos últimos trabalhos permeados por delicada Poesia... Isso sem esquecer de sua presença cênica tão pulsante, dos saltos e braços jogados ao ar, de longas madeixas cheias e de vestidos e graças prenhes da liberdade dos anos 60 e 70 ao lado dos conterrâneos baianos e Doces Bárbaros Gil e Gal, que até arriscou como atriz no delicioso Musical mambembe e genial de Cacá Diegues, Quando o carnaval chegar..., em que "atuava" ao lado dos "maiores desanimadores de auditório" (na debochada pecha de Manoel Carlos), os ultratímidos Nara Leão e Chico Buarque - este, "vizinho de aniversário" no último 19, mas já entrado na casa dos 70 há alguns anos, de quem imortalizou aqueles olhos nos olhos...

Porque vê-la é uma experiência teatral, em suas nuances orquestradas de olhares e gestos por entre a voz, seja ao longe, no alto do altar de algum carro alegórico de sua (e minha também) idolatrada Mangueira, seja bem "de perto", nos closes das apresentações do Fantástico nos anos 70 da era pré-videoclipes, mas uma coisa eu me lembro dela em lamento: que pena eu nunca a tenha visto pessoalmente, num show ao vivo, não tenho isso para lembrá-la... Mas essa "voz-pessoa", no belo dizer do famoso irmão, ecoa e me faz vê-la esvoaçante e atuante por entre cada tom de cobre e bálsamo que exalam de cada interpretação que tenho dela em mim desde sempre... Agora a vejo prateada em seus ainda mais lindos cabelos brancos e ar de completa diva, deusa mesmo, como que prestes a alçar os céus com sua voz de trombeta divina... Que ainda se demore bastante por aqui, que ainda quero vê-la ouvindo-a, quero ouvi-la me lembrando de muito mais coisas... Afinal, são 70 anos de recordações...


sexta-feira, 13 de maio de 2016

Um Super-Aniversário e Uma Superlista:
Entre O Realismo do Cotidiano
E O Divertido Escapismo dos Maiores Heróis de Todos Os Tempos

Eta, povo que briga... Inclusive entre si!
O ano era 1938 e a história de um alienígena fugindo de um planeta em destruição e criado na Terra, vestido com roupas circenses em incríveis desenhos combatendo malfeitores e piscando, ao final, para o leitor, cúmplice de sua identidade secreta na pele de um pacato repórter interiorano, revolucionariam o mundo dos Quadrinhos. Menos de um ano depois e aquele novo estilo progrediria para outro ser especial: um homem dotado de incríveis proezas físicas e intelectuais, só que agora mais soturno - vestia-se de morcego! - e, sem superpoderes como os saltos, a velocidade ou o peito de aço do antecessor, valia-se de seu gênio detetivesco e de suas cordas e engenhocas em revistinhas ainda mais estrondosas em vendas! O mesmo se repetiria com outros incríveis heróis fantasiados que viriam nessa esteira: Mulher Maravilha, Lanterna Verde (original), Jay Garrick (o primeiro Flash), Aquaman, Gavião Negro... E assim começava a chamada "Era de Ouro" nos Quadrinhos, que, mesmo com algumas quedas pelo caminho (como as falências de muitas editoras no Pós-Guerra e as imposições moralistas com o nefasto livro A Sedução dos Inocentes) e com as inúmeras imitações posteriores (à exceção dos geniais Homem-Aranha e dos X-Men, muito do panteão Marvel seria "inspirado" nos medalhões da DC), foi responsável pela longevidade desses personagens de uma mitologia moderna chamada de "universo [ou multiverso] dos super-heróis"...

Eu, que tanto já quis voar, ser indestrutível ou simplesmente cool com uma capa de morcego, a me balançar pela cidade à caça de criminosos pirados, nem preciso dizer que sempre fui mais decenauta que marvette - o que não me impede de continuar empolgado com grandes aventuras dos Vingadores ou do Demolidor! Mas hoje, completando mais uma volta em torno do sol amarelo e à beira dos mais-que-realistas 40 anos, vejo-me como um herói diferente: o que sai pra trabalhar sem saber se destruirão o meu "batmóvel" no trânsito ou numa tentativa de arrombamento (como aconteceu recentemente...); o que "voa" para conseguir pegar a filha de 6 aninhos na escola antes que ela se entristeça tempo demais esperando ou perca a hora do seu almoço; o que cria, com a força da vontade e sem um anel poderoso, os mais diferentes elementos para entreter um dos bebês gêmeos quando doentinho; e coloca as garras de fora se tem de encarar algum processo ou aula impossível...

Injustiças temos aos montes, especialmente no atual momento político do País, mas há várias outras formas de se combater o mal que usando superpoderes imaginários - e um bom debate participativo ou manifestações mais sérias e conscientes nas ruas, por exemplo, podem ser bem mais efetivas que um semideus soltando raios ou erguendo montanhas - na verdade, um bom super-herói, pra começo de conversa, nem deve se meter em Governo nenhum (há tempos, mudaram os discursos "patrióticos" de supergentes como Super-Homem ou Capitão América!)... E, convenhamos, diante de tantos tormentos realistas e problemas psicológicos que têm passado os outrora superpersonagens infanto-juvenis em busca de um mercado mais adulto, nem parece mais tão interessante tornar-se um super-herói!

Mas agora, a fim de seguir na comemoração do aniversário de 12 anos do blogue com este Mês Especial Super-Heróis em grande estilo, nada mais bacana que render uma homenagem a estes super-seres de collants multicoloridos numa pequena eleição interna que os Morcegos fizeram para apresentar a Lista dos Melhores Super-Heróis dos Quadrinhos: claro que não foi tarefa fácil e houve muita polêmica entre os votantes (essa polarização Marvel vs. DC é fogo entre os nossos quirópteros!)... Mas o resultado está aí, com os já costumeiros empates nalgumas posições, e foram levadas em consideração questões como "criatividade original" (primeiríssimo critério!), "histórico do personagem" (equilíbrio na evolução) e "boas histórias ao longo do tempo". Algumas peculiaridades: o "infernal" detetive casca-grossa Hellboy, bem como um dos precursores das roupas collant, o Fantasma, foram os único lembrados de outras editoras que não a DC e a Marvel; alguns heróis evoluíram mais na Era de Prata do que suas versões originais (casos de The Flash e Lanterna Verde e até hoje se mantêm firmes em atualizações interessantes); outros se mostraram bem mais interessantes com o tempo do que na época do seu lançamento mais pueril ou ufanista (como o Capitão América)...

Já as cinco primeiras posições são incontestes: a primeira mulher superpoderosa (semideusa) num meio absolutamente dominado pelo machismo; um grupo inteiro (na formação original e que mais se popularizou: Cíclope, Jean Grey, Fera, Anjo e Homem de Gelo) que "simplesmente nasceu" com poderes (Evolucionismo puro com o conceito de "mutantes") e serve a um professor humanista no combate ao mal - e, empatado na mesma posição em originalidade, um outro famoso X-Man, nascido como um "vilão" meio esquisito que acabou se tornando um dos maiores "heróis anti-heróis" com seu poder de cura, suas garras de adamantium e seu passado obscuro; um adolescente pobretão, cheio de problemas típicos da idade, é mordido por uma aranha radiativa e inicia um revolucionário mundo de possibilidades para os Quadrinhos; um homem traumatizado pela morte dos pais assusta os criminosos vestido numa aterradora figura de morcego humano e se confirma como o maior detetive do mundo; e, sem comentários, uma espécie de deus que, escolhendo a Terra como seu lar, transforma-se num Super-Homem a proteger os fracos e oprimidos, não havia como não ser o maior de todos (ainda que, em sua evolução, muitas historinhas e transformações no personagem tenham deixado a desejar...)!
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LISTA DOS 10 MAIORES SUPER-HERÓIS DAS HQs

1º. Super-Homem

2º. Batman

3º. Homem-Aranha

4º. X-Men/ Wolverine

5º. Mulher Maravilha

6º. Lanterna Verde

7º. Hulk

8º. Flash/ Aquaman

9º. Capitão América/ Homem de Ferro

10º. HellBoy/ Fantasma

sábado, 30 de abril de 2016

Morcegos em Guerra:
12 anos de lutas entre
o Lado Negro da supernerdice
e a Força das Artes em Geral...

  

Lucas e Moore: reinventores da Fantasia e geniais tradutores do mundo infantil para as fábulas adultas...

O mês era maio e o ano, 1977: enquanto eu, em meus primeiros dias de vida, ainda esperneava no choro sem saber direito onde estava, um jovem de trinta e poucos anos chamado George Lucas sabia muito bem o que fazia e estonteava o mundo com sua saga espacial Guerra nas Estrelas (o mesmo primeiro filme da saga, que depois seria rebatizado de "Episódio IV - Uma Nova Esperança"), diferente mistura de antigos seriados de aventura e ficção científica dos anos 40 com inovadores efeitos especiais que, apesar do estrondoso sucesso (tanto que ganhou 7 Oscars, perdendo em "Melhor Filme" para Woody Allen e seu Annie Hall), acabou tachado de "infantiloide" pelos críticos mais puristas, assustados com o que aquele sopro jovem de inventividade comercialesca (mais tarde apelidada de "cinema pipoca") poderia representar para o futuro da Sétima Arte - afinal, além da bilheteria recordista, ali foi inaugurado o merchandising cinematográfico, com suas inúmeras linhas de brinquedos e produtos licenciados! Havia razão na "preocupação": o ano seguinte, enquanto eu seguia alheio ao mundo em meus primeiros passinhos, lançavam Superman - O Filme e as possibilidades da Fantasia de qualidade no Cinema pareciam ilimitadas...

Salto para 1989 e, depois de toda a Magia dos lúdicos anos 80 - Caça-Fantasmas, De volta para o futuro, Robocop, Gremlins, Goonies etc. -, eu, com 12 anos, naquele especial fim de ano de "batmania" (e tome novos licenciamentos...) inaugurada, meses antes, com a estreia de Batman, de Tim Burton, depois de ter comprado um sem número de bugigangas com o símbolo do morcego e em meio ao cheiro de superfaxina e dos deliciosos aromas vindos da cozinha do apartamento sendo preparado para o Natal, aguardava o meu pai voltar do supermercado com o meu especial pedido da banca: o relançamento de A Piada Mortal (1988) me inaugurava num novo estilo de ver os Quadrinhos, até então acostumado que era somente às revistinhas do Zé Carioca, do Peninha e da Turma da Mônica! Eu até já havia me empolgado, aos 7 anos, como todos os amigos da época, com a exibição de Superman na TV, bem como reparado, anos antes, nas coleções do Homem-Aranha de meu irmão mais velho, mas seria mesmo com aquela Graphic Novel (nome chique, "romance gráfico": um verniz mais adulto para as HQs) de Alan Moore e Bryan Boland, relançada na esteira do filme-evento do Homem Morcego, que eu faria o meu début no universo dos super-heróis...

Abril de 2004 e, respirando um pouquinho melhor depois de alguns exíguos prazos cumpridos no primeiro escritório em que trabalhava profissionalmente como um pacato advogado, mal sabia eu que, em meio a algumas conversas pelo MSN e pelo meu dileto StarTac com a amiga de infância Adriana, viria a me tornar uma espécie de "super-herói" no mundo das letras virtuais ao aceitar sua ideia de criar um blog e me aventurar a lançar textos novos e antigos no hoje extinto sítio (alguns de nós ainda resistíamos aos estrangeirismos da internet) de hospedagem Weblogger. Como a primeira postagem, basicamente, conteria uma breve apresentação pessoal e o meu primeiro poema, Morcegos, de 1991, nada mais justo do que batizar o novo espaço com o mesmo nome - e nada mais legal do que aquela imagem descolada na própria web pela então superblogueira Drica4Ever (codinome virtual da minha amiga) para o cabeçalho que usaria a partir de então: uma espécie de "batsinal" toscamente desenhado por sobre uma "lua" parecida com uma bola de isopor (seria um "efeito digital" da época?)! "Cuidado para não ficares perdendo tempo com essa história de blogue e cuida do que é importante!", advertia minha preocupada mãezinha, sem saber valorizar o meu criativo lado na escrita que começava a se consolidar...

Comecinho de 2015 e, sem magia em volta, eu ainda seguia bestificado com a estultice polarizadora entre os brasileiros e suas "discussões políticas" - que, dentre outras coisas, gerava absurdos queremismos em prol da volta da Ditadura Militar (!), a ideia de lançar "bolsomitos" criminosos à Presidência (!!) e um pedido de impeachment sem o devido lastro legal-comprobatório (!!!)... Mas, como há tempos os Morcegos já se haviam cercado de autonomia e passado a não mais publicar ensaios políticos no blogue, restava-me alimentar a esperança em dias melhores com a minha herdeira padawan Isabela, já tendo boas noções de empoderamento feminino com suas princesas poderosas, e consciente, no suficiente para os seus quase seis aninhos, da atualmente triste e negra situação no Senado galáctico (opa, creio que algo se misturou pelo caminho: sempre bom atenuar-se a dura realidade com a Fantasia!) - ao ponto de já saber de cor e salteado a maioria dos personagens de toda a saga Star Wars (agora, tudo tem de ser em Inglês!): Obi-Wan, Princesa Leia, Luke Skywalker, Han Solo, Chewbacca e até "Kailouen", aquele que "é neto do Dárti Vader, Papai"... Mas nem tanto graças aos filmes (dos quais ela só viu os dois primeiros, e do jeitinho dela), mas, sim, aos divertidos videogames dos Angry Birds, que ela adora (e eu também!), no universo espacial de Lucas, e, atualmente, da Disney - que também detém a Marvel Studios, dona dos heróis que ela já conhece dos Quadrinhos na minha biblioteca, como Homem de Ferro, Hulk, Capitão América... Não tem jeito: 'tá tudo misturado!

E chegamos ao atual abril, depois de tanto tempo mergulhados e imiscuídos nas Artes e à procura de salvadores que os Morcegos, plenamente dialéticos e passionalmente envolvidos desde o seu nascedouro com a melhor Fantasia do bem contra o mal entre roupas espalhafatosas e combates cheios de poder, este humilde espaço virtual chega ao seu décimo segundo aniversário alternando, sem crise, entre as mais de 450 postagens só aqui no Blogspot (desde 2005), o melhor da Música (Chico, Tom, Caetano, Gil, Sinatra, Gilberto, Gonçalves, Winehouse, Williams, Morricone, Rota, Mozart...), da Literatura (entre os gênios da Poesia, da Crônica, do Conto e alguns rabiscos pessoais meus nessas áreas), da Televisão, das Artes Plásticas e do Teatro (o que pude acompanhar, é claro, nestas áridas terras ludovicenses...) juntamente ao amado Cinema em sua totalidade e sem preconceitos (Scorcese, Ford, Fellini, Bergman, Spielberg, Tarantino, Kurossawa, entre outros, já passaram por aqui) e à Nona Arte (desde as clássicas tiras, passando pelos super-heróis de ontem e de hoje até chegar às tiras mais maliciosas ou mesmo fundidas de outros meios, como o Jornalismo e a História)! E porque são livres de seu "dono" e contumazes consumidores da criatividade, também lhes desejo felicidades: parabéns, Morcegos!

E este abril foi ainda mais especial graças à incrível ocasião em que alguns dos maiores super-heróis das HQs foram levados à telona com pouquíssimo tempo entre uma estreia e outra (Provocação? Temas iguais? Who cares?!): no finalzinho de março, Batman e Super-Homem foram às vias de fato, separados pela Mulher Maravilha, no muito bom Batman vs. Superman - A Origem da Justiça (que eu só vi no meio de abril!), e, pouco mais de um mês depois, o igualmente aguardado Capitão América 3: Guerra Civil, raríssima ocasião em que a "nerd por osmose" e minha esposa de plantão, Jandira, e eu, fomos por duas vezes ao cinema em tão pouco tempo (coincidentemente, a última vez fora no final do ano passado, para ver Star Wars - Episódio VII - O Despertar da Força)! Parece até que a Marvel e a DC, as duas maiores editoras mundiais do gênero, juntaram-se para homenagear o nosso querido bloguinho!

Enquanto a derivação do polêmico arco A Morte do Superman e da famosa Graphic Novel Cavaleiro das Trevas resultou numa grata surpresa com Batman vs Superman - como já analisado por aqui -, eis que a tão ansiada adaptação do recente arco especial de histórias de Mark Millar e Steve McNiven, "Guerra Civil", ficou um tanto quanto aquém das expectativas marvetes... Longe de ser um filme ruim, pelo contrário: combinando o velho esquema de emendar as tramas do Universo Marvel no Cinema - no caso, toda a primeira meia hora do novo longa é marcada por incontáveis menções a personagens e situações dos anteriores Vingadores - A Era de Ultron (este, sim, bem fraco...) e Capitão América 2: O Soldado Invernal (atualmente o melhor personagem e a melhor trilogia do gênero da telona) - e o aprofundamento de situações vividas pelos (inúmeros) personagens até a situação de confronto entre todos, Capitão América 3 constrói uma densa narrativa e equilibra bem as ótimas sequências de ação com os dilemas e as culpas dos heróis, nem sempre bem sucedidos em suas últimas batalhas épicas pela paz no planeta - tema similar ao de abertura do filme da concorrente DC/Warner...

Entretanto, assim como ocorreu com Batman e Super-Homem, o mais recente produto Marvel parece forçar a barra com algumas "invencionices": se aqui um incomodamente modificado Zemo (nada a ver com o célebre vilão nazista Barão Zemo, do Capitão na Segunda Guerra) é menos onipotente que o Lex Luthor da concorrente (mas nem por isso mais crível: uma vingança pessoal gera um supervilão daqueles?!), as muitas mudanças feitas sobre os personagens e as tramas das HQs pesaram ao querer dar tudo como muito redondo e fechado para "fazer sentido" no filme - o que, pelo contrário, acabou prejudicando a metade final ("Você matou meus pais"... Não, sério?)! E a tão aguardada "guerra" do título, diferentemente das longas batalhas de todos contra todos nas revistinhas, acaba se resumindo a uma curta sequência sem grande violência - e com bem menos heróis envolvidos! Tudo bem, tivemos deliciosos alívios cômicos com as presenças, no combate, do Homem-Formiga (o supercarismático Paul Rudd) e a primeira vez do Homem-Aranha na Disney/Marvel (de longe, a melhor versão do herói na telona, graças ao gigantesco talento do sempre ótimo Tom Holland!), mas parece que até isso soa equivocado durante o ansiado confronto: piadinhas demais num momento dramático de colegas e amigos se enfrentando!

Nada que as (muitas) referências diretas às histórias recentes da Marvel Ultimate - como a entrega do escudo pelo Capitão, como uma forma de se tornar independente de qualquer ligação com o Governo (que quer monitorar as ações heroicas depois dos eventos em Sokovia) ou a cena final pós-créditos (onde passado e presente do Cabeça de Teia se misturam e emocionam...) são excelentes! Afora a seriedade geral com que já vinham sendo conduzidos alguns desses grandes heróis de tão longa data... E, cá entre nós, numa época em que a grande maioria dos lançamentos do Cinemão norte-americano há muito já abandonaram o bom senso e a qualidade em nome apenas de fortunas em vendas antecipadas de bilheteria ou de intermináveis linhas de brinquedos e produtos licenciados, acompanhar esses últimos três lançamentos, de Star Wars VII até aqui, que remontam à minha infância, e ver o carinho com que tudo foi feito, estimula a criatividade de espaços como este, que acreditam num admirável mundo pop sempre renovado no coração do culto nerd mais saudosista...

Este novo universo, no entanto, não agrada a todos: por exemplo, o Mago Alan Moore, o mesmo genial roteirista de A Piada Mortal do início desta crônica-ensaio e de tantas outras obras-primas dos Quadrinhos - como a épica V de Vingança, a reformulação filosófica de Marvelman com Miracle Man (aguarde as próximas postagens especiais a respeito) e da definitiva obra realista e pessimista sobre o universo do collant colorido e mascarado em Watchmen (cuja famosa capa da sua 12 edição é a homenageada dos 12 anos dos Morcegos) -, recentemente afirmou, em mais uma de suas polêmicas declarações contra tudo e contra todos (até mesmo os seus fãs mais ardorosos e o seu próprio passado como renovador cultural que foi, elevando a Nona Arte dos Quadrinhos a um status adulto e elucubrador), que considerava os super-heróis "abomináveis", uma "catástrofe cultural", diante do fato de que teriam sido criados para crianças de 9 a 13 anos de idade e, hoje, depois da "invenção do termo Graphic Novel", "homens com 30, 40, 50 e até 60 anos" continuam "com seu amor pelo Lanterna Verde e Homem-Aranha sem querer parecer emocionalmente anormal"! Quanto exagero (e ofensa...) - afinal, qual arte que não significa um escapismo da realidade, numa releitura a mais ou a menos aprofundada do que se vive a depender da necessidade do momento de cada indivíduo?! E o mito dos super-heróis, a despeito dos modismos atuais (que, realmente, muitas vezes os tornam rasos demais, mero material promocional para licenciamentos), sempre foram e serão fortes elementos da Cultura Pop mundial - com todas as nuances boas e ruins que isso venha a significar...

Particularmente, vejo tudo com bons olhos, independente do desvario de se produzirem tantos e tão cansativos títulos, no Cinema ou nos Quadrinhos, ultimamente: basta um pouco mais de equilíbrio - o somatório geral, porém, é muito bom! Porque vim daquela alvorada das grandes ideias pop no mundo das artes, quando a Fantasia e a Magia arremessaram contra as fronteiras etárias e se mostraram ao mundo em suas complexidades fascinantes, podendo ser apreciadas por qualquer um em meio a outros tipos de profundidades artísticas... Há quem não goste, mas fica quase impossível simplesmente chamar-se de "besteira" ou "tolice infantil" diante de tanto amadurecimento de artistas e personagens ao longo das últimas quatro décadas - se J. R. R. Tolkien já era consagrado com a sua Saga do Anel na década de 50, foi mesmo com as releituras de seus livros cheios de metáforas sobre a Guerra e as Religiões, em plenos anos 90 e 2000, por seus admiradores daquela época (como o próprio Lucas e Peter Jackson, diretor da trilogia O Senhor dos Anéis nos cinemas), que ele se tornou um ícone cultural, abrindo espaço para discípulos ilustres, verdadeiras celebridades atualmente, como George R. R. Martin e sua vasta obra multimidiática Games of Thrones!

E o que há de ruim num escapismo saudosista? Adoro tanto os clássicos relançamentos dos anos 40 e 60, onde o bem e o mal eram bem delineados e as historinhas, bem mais ingênuas, como dos modernos conflitos existencialistas e das nuances do "ninguém é completamente bom" ao ponto de sair incólume, mesmo a defender o mundo das HQs dos super-seres, tanto fazendo se da DC ou da Marvel... E, até hoje, vez por outra me pego voando, nalgum sonho em meio às tantas dificuldades da dura realidade de homem de quase 40! Agora, por exemplo: como seria possível publicar este texto enorme (sim, a maioria não o lerá em sua completude, mas é aniversário dos Morcegos, puxa vida!), concluído na virada do dia do trabalhador para o dia 2 de maio, sem os meus superpoderes de voar mais rápido que a luz contra a rotação da Terra e poder voltar o tempo a fim de postar ainda no aniversário do dia 30 de abril?! Como? Simplesmente alterando a data da publicação no sistema do Blogspot?! Mas que sujeito sem imaginação você é, meu caro... Recomendo que jamais deixe de acompanhar os Morcegos, seja qual for a sua idade, para o alto e avante!



Se você contar direitinho, em homenagem aos 12 anos, são 12 parágrafos bem fartos nesta postagem especial...
 

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