quinta-feira, 23 de abril de 2015

Gênio de Sonho

Hoje é aniversário do gênio-maior de nossa Música, Alfredo da Rocha Vianna, o Pixinguinha  e, não por acaso, é também celebrado o Dia do Choro, gênero inicial de nossa Música! Acho que, por isso, sempre sinto abril como que permeado pela flauta de Altamiro Carrilho ao fundo, com o clássico Odeon, de Ernesto de Nazareth, ou a maravilhosa Pedacinho do Céu, de Valdir Azevedo (devidamente "apropriada" pelo amigo Ricarte Almeida Santos, em seu Chorinhos e Chorõesradiofônico baluarte maranhense de alegre resistência do Choro), a tocar em minha mente como uma espécie de "tema do mês"! E, aproveitando a ocasião pra lá de especial (e absoluta falta de tempo atual), republico hoje esta crônica poética feita em 2005, com um passeio onírico pela vida deste gênio simples, que há tanto tempo (+ 1973) deixou esta 'terra brasilis' mais empobrecida... Saravá, Pixinga!


Gênio de Sonho
(Dilberto L. Rosa, 2005)

Às vezes me pego numa velha cadeira de balanço de tempos idos a divagar sobre, nessa vida, onde é mesmo que termina o sonho e começa a realidade... Na verdade, mais penso no que os grandes poetas já disseram do que realmente crio coisas novas (como quando penso nos sonhos de Fellini, poeta da imagem, em seus oito e meio de arte nota dez). Ainda assim, teço minhas teias, sem pressa, antes que o sono venha me buscar...

Em meu saudosismo quase patológico, envolvo-me na pureza (ou na ideia de que ela possa existir) da melodia mais perfeita e me sinto tragado por uma pastoral de Beethoven ou por alguma das estações de Vivaldi (aí é que a divagação fica completa!) e logo penso que antes do branco era o preto e que antes da melodia havia o batuque: passo a imaginar um preto alto, magro, desajeitado, com a cara marcada e a boca de aparência desdentada, e dela sai o mais belo som de flauta, tão bonito quanto uma pastoral ou uma estação (ou ainda uma variação bachiana), porém mais pungente  tem malícia, tem ginga, um tempero todo diferente...

E que venha o piano, o saxofone e o instrumento que for, que o preto toca! E arranja (coisa nova até então) e compõe e orquestra para quem não sabe ler partitura e reinventa a música que antes só se via branco tocar... E segue o sonho, com o preto sendo aplaudido pela brancarada de todo lugar, de Paris a Buenos Aires, com Vila Lobos, Stokowski e Gnatalli a se babar - até o rei belga vinha se encantar! E tal como um Mozart, com um Sallieri em seu encalço, o preto, por vezes esquecido ou ainda perseguido pela bebida, foi tantas vezes invejado e injustiçado pelos Lacerdas da vida... Mas o preto, danado que só ele, acabou passando por cima de tudo, macumbou em Macunaíma, ensinou contraponto por tabela a muita gente, abrasileirou os clássicos europeus juntamente aos sambas africanos (criando um lamento novo, como num choro de criança que nasce) e ainda morreu como santo, numa igreja, em pleno carnaval...

Às vezes penso (ou sonho, ou divago...) se Pixinguinha mesmo existiu... Afinal, todos tantas vezes o viram de pijamas que chego a pensar se ele, ingênuo com toda aquela sua pureza, não estaria dormindo e sonhando sua música perfeita dentro de algum outro sonho que não o meu... Teria ele mesmo nascido (quando, afinal: em 1887, em 1888... em 1933?!), e seria no Catumbi ou na Piedade? E o apelido: viria do Bexiguinha da varíola ou do Pizindim de menino bom (e a tal avó africana realmente aconteceu?)? Eu me pergunto se esse preto batuta e genial realmente existiu ou se tudo não passou de um devaneio da Música Brasileira, que quis um dia nascer autêntica e acabou tomando carona no sonho dos acordes de mestre inventado pela mais pura e virtuosística composição musical já sonhada...

Acho que sofro porque quero e vivo perdendo a noção da realidade de propósito... Acordo, de repente, com o telefone e me pego com uma rosa no colo, ouvindo Carinhoso no rádio antigo, divagando, tristemente, naquele tempo maravilhoso que não vivi, a me embalar tetricamente na grande cadeira de balanço da casa do meu tio-avô Urbano, que adorava Pixinguinha e que hoje já não existe mais em lugar algum além de nas minhas melodiosas e oníricas recordações...

 

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