terça-feira, 13 de agosto de 2013

Revivendo Alfred...


Apesar de inglês e de ter começado sua carreira na terra da Rainha, meu primeiro contato com este genial diretor, raro exemplar de "gênero de si mesmo", foi com o seu primeiro trabalho nos EUA: Rebecca - A Mulher Inesquecível não me apeteceu de cara, dadas algumas de suas feições afetadas e teatrais comuns a uma boa parte das produções norte-americanas da época, só vindo a ver as qualidades daquele filme anos depois, quando pude perceber o artista por trás daquele formato 'mainstream'... Noutras palavras: Alfred foi tão brilhante que conseguiu fazer um ótimo filme sem desagradar os modelos convencionais que o Cinema estadunidense queria ao lhe dar as boas vindas ao Novo Mundo! Rebecca levou o Oscar de melhor filme, mas o diretor por trás do espetáculo acabou injustiçado, sem premiação - curiosamente, ele não só jamais levaria o prêmio da Academia, como também nem um outro trabalho seu ganharia novamente como melhor filme...

E com o grande sucesso inicial em terras ianques, Hitchcock espertamente acabou por estabelecer um "modelo" para seus próprios filmes: com tudo em estúdio para ter mais controle (especialmente quanto à sempre excelente fotografia, com raras filmagens em locações), trilhas sonoras inesquecíveis (o magistral Bernard Hermann, seu principal colaborador, criou para o mestre inglês "hinos" do Cinema, como os violinos de Psicose ou a pulsação de Um corpo que cai) e elencos sempre muito bem dirigidos (que, dizem as más línguas, especialmente as das "atrizes loiras" com quem trabalhou, o diretor tratava como "gado"), foi muito além do subgênero Suspense, do qual se tornou um símbolo, para explorar outras faces da Comédia (O Terceiro Tiro e Interlúdio: sofisticado), do Drama (O Homem Errado, com Henry Fonda, baseado em história real), do Terror (Psicose e Os Pássaros) ou da Aventura (Intriga Internacional e Topázio) - todos pontuados por uma inigualável técnica de contar histórias...

Longe de entregar as coisas com facilidade, Alfred Hitchcock sabia como poucos envolver o público em suas tramas: nada de chocar com a explosão de uma bomba; melhor revelar ao público sobre a bomba e nos tornar seus cúmplices diante dos personagens inocentes, sem saber de nada... Nada de mistérios ou sustos gratuitos, Suspense não é isso: "Interesso-me menos pelas histórias do que pela forma de contá-las", dizia o rechonchudo cineasta, com jeito bonachão, mas sempre com fina ironia e humor sarcástico muitas vezes mal compreendido ou interpretado como "arrogância"... Sem dúvida, um grande contador de histórias, com bom humor em cada detalhe, desde o excelente 39 Degraus, ainda na fase inglesa, onde manipulava, com bastante ação e humor, uma investigação de espionagem, até seu último filme, Trama Macabra, com um adoravelmente cômico time de escroques!

"É inútil ver em mim intenções profundas; não estou nem um pouco interessado pela mensagem ou moral do filme - sou, digamos, um pintor de flores..." disse, certa feita, um modesto Hitch, talvez autoparodiando-se por sua tradicional "veia comercial". Uma injustiça: poucos conseguiram imprimir marcas tão profundas nas telas, ainda que em trabalhos sucessos de público... Um exímio artista no antigo sistema de estúdios, num popular, porém muito criativo, Cinema de autor em trabalhos tidos como "comerciais"! E, falando nisso, nada melhor do que, neste simbólico 13 de agosto, data de aniversário do gênio inglês (morto em 1980), relembrar os meus 5 clássicos favoritos deste gênio da 7ª Arte - sem esquecer a famosa "pontinha" do diretor em cada trabalho:


05. Os Pássaros (The Birds, 1963): se este filme "demora um pouco para começar", com uma trama bem mais simples que a maioria dos seus trabalhos, aqueles incríveis efeitos especiais e os sufocantes ataques de pássaros aterrorizantes numa cidadezinha no meio do nada norte-americano deram aula para os sucessores filmes catástrofes com animais assustadores da década de 70 (todos, com exceção do clássico Tubarão, infinitamente menores) - ironicamente, Alfred Hitchcock aparece neste filme saindo de uma 'pet shop', com dois cachorros;

04. Festim Diabólico (The Rope, 1948): fiquei embasbacado quando vi este filme pela primeira vez num antigo Corujão da Globo, desesperado em procurar o próximo "corte" de edição (tudo foi filmado continuamente, com cortes quase imperceptíveis somente para mudar o rolo de filme); inesquecível a viagem inicial pelo apartamento da câmera-personagem, bem como o brilhante jogo de diálogos entre os personagens assassinos e seu professor, o impecável James Stewart - curiosidade: único filme com "duas aparições" do velho Hitch, caminhando na rua logo nos primeiros segundos e, depois, em
neon, com sua famosa silhueta em vermelho no fundo da cena;

03. Psicose (Psicose, 1960): se hoje a maioria dos jovens só conhece sustos e horrores explícitos cheios de sangue nas telas, escorria um singelo achocolatado na banheira ao final da famosa cena do esfaqueamento no chuveiro (detalhe: o impacto da cena ainda hoje é grande, mas não se vê uma perfuração sequer!); mais um ponto para o gênio, que acreditou num roteiro tão cheio de subtramas, que tinha tudo para dar errado, e fez dele um clássico absoluto - aparição: parado em frente a uma 
janela do escritório onde a personagem de Janet Leigh trabalha;

02. Janela Indiscreta (Rear Window, 1954): e falando no parceiro de tantos filmes do velho Alfred, James Stewart imortalizou o fotógrafo 'voyeur' acidentado que, do seu apartamento, passa os dias confabulando mil teorias sobre os vizinhos que acompanha por meio da sua teleobjetiva, num nada discreto cenário entre fundos de prédios de apartamentos (direção de arte primorosa em estúdio e mais um exemplo de "cenário-personagem") - o diretor aparece mexendo no relógio de parede de um pianista;

01. Um corpo que cai (Vertigo, 1958): um James Stewart inspirado, num dos seus melhores trabalhos, vivendo o atormentado policial aposentado por sofrer vertigens de acrofobia e que é contratado por um amigo para uma estranha investigação; uma Kim Novak nunca antes tão linda e sedutora em seu "papel duplo"; um mergulho psicológico no amor e no medo humanos, bem como a obsessão por algo que não se pode ter; o desejo ambíguo entre o real e o imaginário; o suspense misturado a doses de terror entre o real e a possibilidade do sobrenatural; um final impactante que já entrou para os anais da História do Cinema mundial; uma San Francisco onírica, uma trilha inesquecível (Hermann outra vez)... Tantos elementos reunidos resultaram no trabalho mais completo de Hitchcock, não à toa sempre lembrado em qualquer lista dos 10 melhores de todos os tempos! Sua aparição? No cais, caminhando de uma ponta a outra da tela...


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3 comentários:

Ruby on 13 de agosto de 2013 às 18:51 disse...

Excelente, mestre Dilberto! Entre as genialidades de Hitch, essas que acho fantásticas, as breves aparições dele mesmo em suas produções, às vezes fico relembrando os filmes e pensando se vi logo de cara ou tive de rever pra achá-lo. Bem, não lembro a 1ª produção dele que vi, mas dos 05 escolhidos eu pego três pra minha lista 05, 03 e 01 e poria Notorious e claro, de novo, pela deusa nórdica Ingrid Bergman ♥, Spellbound (sempre prefiro os títulos originais)Tenho muitos em DVDs e revejo sempre que dá.

Gilberto Carlos on 14 de agosto de 2013 às 07:24 disse...

Hitchcock era sempre genial. Não me canso de ver seus filmes. Os 5 filmes que você citou estão entre os melhores dele. Abraço.

Elizabeth F. de Oliveira on 16 de agosto de 2013 às 15:01 disse...

É sempre um prazer ler teus textos, caro amigo. E cinema é uma assunto maravilhoso, sobretudo tratando-se de Hitchcock, que deixou uma indelével marca na sétima arte.
Fico muito feliz que estejas de volta, até que as férias não foram longas, para a alegria de teus leitores.
Agradeço a visita e te convido a voltar sempre para fazeres uma Pausa para um Café. Tem postagem nova por lá.
Abraços da poetA.

 

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