Junte um diretor inexperiente; um ator desconhecido e outro, em plena decadência (que daria ao Cinema uma das melhores interpretações de todos os tempos); um 'best-seller' sobre uma família de mafiosos (jamais se podendo usar a palavra "máfia" - sérios problemas à vista...); a volta aos formatos de sagas épicas; e uma fotografia escura demais (Gordon Willis) - no que isso resulta? Quem pensou "num desastre", enganou-se redondamente... Trata-se, sim, de um dos maiores filmes de todos os tempos: O Poderoso Chefão (The Godfather, 1972) que, neste mês de março que se encerra, completa 40 anos.
O que dizer de uma obra-prima que atravessa décadas como um clássico absoluto, tão bom quanto (ou até melhor que) o próprio livro de Mario Puzo, em que foi baseado? Difícil... Um belíssimo e apurado trabalho de direção de um quase estreante Francis Ford Coppola (lê-se "cópola") - que seria responsável, além deste, pelos outros três melhores filmes da década de 70 - O Poderoso Chefão Parte II, A Conversação e Apocalipse Now... Uma já legendária trilha sonora, do compositor italiano Nino Rota ("auxiliado" diretamente pelo "maestro-pai" Carmine Coppola, não creditado)... Uma narrativa rica de personagens e diálogos (e mais umas 60 cenas de comida espalhadas pela trama), a inverter, de cabeça pra baixo, o polo dos "protagonistas" (pela primeira vez, torcia-se pelos "bandidos", situação erroneamente compreendida, muitas vezes, como uma ode à máfia - o que nunca foi)... Cenas inesquecivelmente épicas de morte (como esquecer o encurralamento de Sony? E o atentado a Don Vito? Ou a explosão do carro da Sra. Michael Corleone)...
Mas além de todas essas qualidades, talvez as duas coisas que mais chamem a atenção para este épico dos "filmes de gângsteres" sejam a excelente montagem, alternando belos momentos familiares (festa de casamento da caçula; jantares etc.) com as tragédias policiais que, aos poucos vão minando aquela família por trás dos "negócios", e as incríveis interpretações de um elenco afiadíssimo, em especial a legítima aula de interpretação de um "decadente" e "encrenqueiro" Marlon Brando (mais uma vez sumindo por trás de um personagem; neste caso, bem mais carismático e grandioso do que no próprio livro original) - que, se estivesse vivo, completaria 88 anos nesta terça, dia 03 - e de Al Pacino, o então preterido "desconhecido"...
Sem dúvida, um divisor de águas! Ainda mais quando este filme, genial em inúmeros aspectos, gerou uma sequência igualmente maravilhosa (para alguns, ainda melhor que o primeiro - pela primeira vez, uma continuação ganhava o Oscar de melhor filme tal como o primeiro, e dois atores diferentes, Brando e DeNiro, levavam a estatueta dourada pelo mesmo personagem, o inesquecível Don Vito Corleone), O Poderoso Chefão Parte II, com suas lindas idas e vindas no tempo entre a origem da família de mafiosos e a ascensão cruel de Michael Corleone como o novo "padrinho" (Pacino, assustadoramente irrepreensível). Isso sem falar no não tão genial, porém belo desfecho, O Poderoso Chefão Parte III (que mais corretamente se chamaria "A Morte de Don Corleone", por acreditar Coppola que se tratava de um epílogo e não de uma sequência dos anteriores), que, quase duas décadas depois da segunda parte (1974/1990), encerra melancolicamente a trajetória banhada de sangue da 'famiglia' mais famosa do Cinema...
"Um dia, e talvez esse dia nunca chegue, eu vou lhe pedir um favor, mas até lá considere a justiça como um presente pelo casamento de minha filha"... Um brinde com o melhor vinho (acompanhado de uma bela macarronada, de preferência com receita do molho caseiro mostrada no filme) a este épico moderno com alguns dos melhores momentos do Cinema de todos os tempos!