Batman vs. Superman - A Origem da Justiça **½
Em seguida, somos arremetidos a um Bruce Wayne bem mais envelhecido do que suas costumeiras versões cinematográficas: o desespero, agora, é contra o tempo, a fim de evacuar um prédio financeiro das Wayne Enterprises em Metrópolis durante a devastadora sequência de luta (que encerra o polêmico Homem de Aço) entre o Super-Homem (quem quiser, que o chame de Superman - not me!) e o General Zod, mas só consegue salvar uma garotinha em meio aos destroços e olhar, com muita raiva, para os céus, como que a odiar o surgimento daquele Novo-Deus capaz de tanta destruição... Mais curiosamente ainda é como aquela longa sequência cataclísmica do final do primeiro filme do Super (também dirigido pelo exagerado Snyder), para a qual tantos, como eu, torceram o nariz, agora, vista por outro ângulo, o das pessoas normais, impotentes diante daquela espécie de 11 de setembro deles (só que com alienígenas superpoderosos no lugar de terroristas), funciona, e muito bem!
Mas, para além do acachapante e perfeito início, o mais surpreendente foi ver o tão criticado Ben Affleck, tão cercado de expectativas negativas pelos fãs do Morcego por ser mais conhecido por papéis canastrões em dramas clichês ou comédias românticas e de besteirol dos anos 90 - e por sua nada memorável passagem pelo péssimo Demolidor, em que viveu o famoso super-herói cego da "outra editora" -, simplesmente já anunciando, naqueles poucos instantes, que entregaria o melhor Bruce Wayne do Cinema, situação que só se confirmaria ao longo dos mais de 150 minutos de projeção! Sim, o melhor Bruce, porque o seu tão aguardado Batman, neste longa mostrado como uma versão atenuada do velho, ultraviolento e inescrupuloso herói da graphic novel O Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller, assustou muita gente... Mas, frise-se, não por culpa do maduro ator (compenetrado e tenso na medida e com a aparência bem similar ao Bruce espadaúdo e de queixo quadrado da clássica animação Batman - A Série Animada), mas, sim, pela abordagem escolhida para o herói - capaz de dar de ombros com as mortes pelo seu caminho e até marcar os criminosos com um morcego em ferro quente! Deu até saudade da já durona versão do Christian Bale...
Sim, há algo de tenebroso surgindo entre Gotham e Metrópolis e toda a atmosfera do filme possui um tom seco, violento e bem lúgubre... "Tirem as crianças da sala": foi-se o tempo em que podíamos chamar os pequenos para vermos, todos juntos, numa Sessão da Tarde inofensiva, um super-herói com sorriso carismático para a câmera, a salvar um gatinho de cima de uma árvore ou pegando um helicóptero em queda livre com uma só mão (ambas famosas sequências de Superman - O Filme, homenageadas com interessantes citações neste longa)! O mundo mudou, ficou muito mais cínico, e alguém que possa voar, soltar raios de calor pelos olhos e destruir uma cidade inteira, ainda que lutando a favor da humanidade, pode ser visto com muita desconfiança - além de ter que dar explicações aos poderes constituídos (em especial, a políticos liderados por uma senadora muito bem interpretada pela veterana Holly Hunter, de O Piano) e refletir sobre o seu papel em meio a tantas manipulações de notícias e incitações a ódio em tempos de rápidas e viscerais redes sociais na internet!
São tempos sombrios... Mas tal excesso de sombras acaba comprometendo as boas ideias deste longa! E nem é preciso lembrar que o clima opressor está garantido pela fotografia costumeiramente escura e saturada em tom sépia (em que quase não se vêem as cores reais, com tudo tendendo para o bronze) de Larry Fong, habitual parceiro de estilizações do diretor. Só que, outra surpresa: o estilismo serve muito bem a esta dura história de construção de rivalidades, bem típicas nas últimas décadas de encontros e desencontros ruidosos entre os dois medalhões da DC nas HQs, e dos conflitos que cada alter-ego vive em suas privacidades por baixo das máscaras e dos collants (finalmente livraram o Homem-Morcego das amarras daquelas imobilizadoras roupas emborrachadas pretas!)...
"Ah, mas com tantos personagens, tramas e subtramas, tudo deverá ser bem raso"... Até que não: a história principal vai-se aprofundando paralelamente ao devido tempo necessário para que todos os personagens cumpram com seus papéis: Lois Lane com sua "vida conjugal" ao lado de Clark; Perry White com suas manchetes ora críticas, ora sensacionalistas; Martha Kent, embora em pequena participação, decisiva na trama; o mordomo Alfred (incorporado à perfeição por Jeremy Irons) e seu papel de parceiro, diretamente da caverna, no combate ao crime com as altas tecnologias do "Mestre Wayne"; e Diana Prince - sim, ela também é coadjuvante -, surgindo de relance aqui e ali, ora para desfilar sua intrigante beleza, ora para criar expectativas que quase nunca se cumprem...
E aí começa um dos primeiros defeitos do roteiro: por mais que se saiba que a trama girará em torno do confrontamento entre os "Melhores do Mundo", além de Batman e Super-Homem - e, mais especificamente, Clark Kent e Bruce Wayne -, Diana é colocada, insistentemente, apenas como um incômodo teaser, como que somente provocar e a marcar presença para as continuações - "Agora ela vai reagir"... "Ela vai explicar algo"... "Acho que é agora que ela vai se revelar uma super-heroína"... que bem poderia ter mais destaque e background além de simplesmente surgir devidamente caracterizada como Mulher Maravilha no combate final (o que não é nenhum spoiller, uma vez que fartamente evidenciado nos vários traillers)...
E, falando em teaser, isto é o que não falta no roteiro de Chris Terrio e David Goyer (este último um velho conhecido dos fãs da Trilogia do Batman de Christopher Nolan): heróis como Aquaman (Jason Momoa?!), Cyborg (assustador vídeo de "origem" revelado!) e Flash (vivido por um ator desconhecido, de traços orientais...?) dão as caras rapidamente, por segundos, de maneira a revelar que um filme da Liga da Justiça está a caminho. Em alguns pontos do novo longa, rápidos inserts televisivos (quando noticiam fatos com pequenos saltos de informação sobre o que estamos vendo: outra influência herdada de Frank Miller) e algumas referências para os ávidos leitores de Quadrinhos, mesmo que sem nenhuma conexão com o restante da trama (como nas excitantes cenas onde se vê o gigantesco ômega de Darkside ou o aviso desesperado do velocista escarlate, tal qual em Crise nas Infinitas Terras), em nada comprometem a narrativa, tampouco deixam a sensação de "filme-pipoca" sem profundidade!
O que desacelera mesmo a empolgação é ver que, após estabelecidos os personagens principais (o Batman de Affleck, o Super-Homem de Cavill e o Lex Luthor de Jesse Eisenberg, mais para Coringa alucinado do que para um jovem Lex Luthor Jr.), os coadjuvantes e a trama principal - que, frise-se, resulta num belo e bem realizado embate entre "A Noite" e "O Dia", com excelente direção de ação e efeitos por sobre inúmeras citações às HQs (como a já clássica armadura do Homem-Morcego e a reação cadavérica diante da explosão nuclear de um míssil, ambas, novamente, de O Cavaleiro das Trevas), a trama se rende à tentação dos mais-que-batidos clichês do gênero... Não há como não torcer a boca para tantos vacilos que, atropeladamente, marcam a projeção antes mesmo do tão ansiado embate do título e já nos fazem calcular exatamente o que vai acontecer no restante do longa: meio que contamos os minutos para ver o que ainda cabe e a até então excelente construção para o clímax, com a luta do século no Cinema, acaba eclipsada!
Bom, creio não poder dizer nada além do que os diversos traillers de lançamento já anunciavam: sim, o supervilão derradeiro é mesmo o Apocalipse, do arco de histórias A Morte do Superman, da década de 1990 (só que com algumas diferenças bem incômodas...), e, sim, o final, em meio às aceleradas conduções conclusivas numa história que prometia bem mais, termina sendo gratuitamente estranho e picotado (ainda mais se considerarmos as mais-do-que anunciadas sequências que virão)! Pois é: a mão pesada do diretor Snyder, que poderia redimir-se de uma vez por todas neste Batman vs. Superman e se consagrar num feito histórico como uma das melhores adaptações modernas de HQs para o Cinema, faz-se sentir da metade para o final e compromete, no cômputo geral, o que poderia resultar num excelente feito - maior mesmo que Os Vingadores, pequeno clássico simplista, porém extremamente bem conduzido pelo quadrinhista e diretor Joss Whedon para a rival Marvel! A propósito: coincidentemente (ou não...), os estúdios da Casa das Ideias vêm com tudo em mais um filme de embates memoráveis de heróis contra heróis com Capitão América: Guerra Civil, neste mês particularmente especial - além de grandes adaptações cinematográficas dos personagens mais amados pelos nerds de todo o universo, os Morcegos completam 12 anos na blogosfera!
Apesar dos senões, há em Batman vs. Superman, assim como em todas as adaptações cinematográficas da Warner/ DC um estilo diferenciado em relação às produções da Disney/ Marvel, meio por "culpa" do sucesso da "Escola Nolan" de realismo fantástico visto na Trilogia Batman (encerrada com o razoável O Cavaleiro das Trevas Ressurge), meio por culpa do "tempo perdido" em relação ao Universo Marvel já construído no Cinema: Super-Homem, Batman, Mulher Maravilha (cuja aventura solo está prometida para 2017) e o grande panteão dos heróis que formarão a Liga - alguns já fazendo sucesso na TV, como o seriado Flash - parecem ter mesmo que correr a fim de fazer frente à já avançada "linha de produção" da outra editora/produtora... De qualquer forma, este "padrão diferenciado em realismo" me soa mais adequado aos dias de hoje e menos gratuito e mal ajambrado do que alguns filmes da concorrente (como o fraquíssimo Vingadores e A Era de Ultron) - que parece só ter acertado completamente com os títulos do Capitão América (não por acaso, Guerra Civil é dessa linha, embalada num ritmo mais próximo dos atuais rumos do gênero ação/espionagem no Cinema, como a Trilogia Bourne)! Por isso é que, fatalmente (ops) se pode afirmar que, "entre mortos e feridos, salvaram-se todos"... Silêncio, Morcegos: olha os spoillers! Já bastam as guerras políticas diárias da internet e a polarização DC vs. Marvel...
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