Tanta coisa louca que andou acontecendo nesse interregno março/abril que, juro, não entendo mais nada: os Morcegos dando espaço para alguma coisa da leviana e ditatorial Veja (foi por uma boa causa: ridicularizar o Sarna)?! E a "Nardonimania" (ou "Nardonifolia"!)? - galera em porta de Fórum soltando rojões e gritando para as câmeras comemorando o quê: Final de Copa do Mundo ou uma prisão anunciada de dois monstros insensíveis que deixarão duas crianças "órfãs" e uma menina que nunca mais vai voltar?! E o que dizer do estardalhaço em torno da "saída do armário" de Rick Martin - alguém ainda duvidava?!... E as centenas de pessoas morrendo soterradas e os partidos e os jornais televisivos sensacionalistas discutindo de quem foi a culpa, se do "povinho", dos Governos ou do próprio Lula (!)?
"VIVA ZAPATA!"
E por falar em Lula, dá pra entender ouvir de um líder metalúrgico, opositor de um governo ditatorial nos anos 70/80, inclusive com greve de fome, a comparação de alguns dissidentes cubanos em greve de fome a "bandidos de São Paulo"?! Tudo bem que muitos prisioneiros comuns ali na Ilha podem muito bem aproveitar-se da situação e se "converter-se" em presos políticos... Mas daí a não se ouvir uma palavra sequer do "Líder Internacional Lula" (resumindo-se tudo a "falar discretamente", em "conversas internas" sobre o polêmico assunto, no dizer do chanceler Celso Amorim, que fechou com o chavão que tanto agrada os ditadores cubanos: "Se alguém está interessado em uma evolução política em Cuba, eu tenho a receita rápida: acabe com o embargo") sobre a greve de fome (e consequente morte) de Orlando Zapata Tamayo, foi, no mínimo, uma decepção... Seria ainda por influência daquela eterna utopia, daquele sonho do paraíso comunista, que vence todas as adversidades, inclusive o "Império Ianque", com educação e saúde de Primeiro Mundo?! Não, não é possível...
Viagem ao Crepúsculo
Que bom que existe gente como o cearense-recifense jornalista Samarone Lima, que, no seu último e ótimo livro, Viagem ao Crepúsculo, lança mão de seus conceitos políticos idealizados e adoradores da velha e utópica Cuba com que muitos velhos esquerdistas ainda sonham (inclusive ele, antes de para lá viajar em 2007) para viver a realidade nua e crua de bairros pobres e do cotidiano de pessoas que fazem das tripas, coração para sobreviver numa Cuba nada 'libre'!
Assim, em seus parágrafos curtos e em tom de diário, o velho Samá (tal como os amigos cubanos passaram a chamá-lo) vai desfilando, com muito bom humor (alguns cubanos mais espertinhos são descritos por sua aparência, na ausência de um nome: "O garçom, com seu tradicional chapéu cubano, tinha uma cara de boxista médio-ligeiro ... 'O amigo vai comer o quê?', voltou Médio Ligeiro, me tirando da tranqüilidade do posto de observação."), o dia-a-dia real de um País "socialista" dividido entre ricos e pobres, nativos e estrangeiros, cheio de contrastes (Pesos cubanos e convertibles, Internet e jornais estrangeiros em hoteis suntuosos para turistas estrangeiros e Granma com uma eterna "realidade de conquistas" para os cubanos, TV estatal e TV a cabo proibida...) e de desesperanças para um povo que um dia acreditou, mas, que hoje, só luta para ganhar clandestinamente o sonho de comer um frango mais um dia, rezando baixinho, que é para Fidel não ouvir e encarcerá-lo por 20 anos em julgamentos céleres: “Quando esse inferno vai acabar?” - sussurra uma idosa em mais uma tentativa frustrada de adquirir sua cota mensal de carne no governo do então Presidente do Conselho de Estado da República de Cuba, Fidel Castro...
Seguem três ótimos trechos que bem poderiam ser enviados, por 'e-mail', para alguns presidentes ou pensadores socialistas esquecidos - ou, melhor ainda, ser incluídos os endereços dos autores destes desabafos nas rotas das próximas viagens, oficiais ou apenas turísticas, àquele País...
"Como em quase todas as conversas com os cubanos, não era necessário perguntar nada. Martha falou rapidamente sobre seu trabalho, e me perguntou:
'Sabe quanto um médico ganha em Cuba?'
'Não', respondi.
'Pouco mais de 40 dólares, brasileiro'.
Ela fez um silêncio para que eu assimilasse as informações, e prosseguiu:
'E o de um aposentado?'
'Não faço a menor idéia'.
'Pouco mais de 10 dólares', emendou Paco.
'É por isso que os médicos cubanos estão todos metidos em missões fora de Cuba. Estão na Venezuela, África, América Central. Nos hospitais de Cuba, o que mais a gente encontra é estudante de Medicina. Chamam isso de 'Médicos Internacionalistas', porque aqui eles conseguem criar nomes lindos para tudo.
(...)
Perguntei a Martha como estava a vida dos dois pugilistas cubanos
que tentaram fugir durante o Pan.
'Acabou tudo para eles, tudo. Não podem disputar mais competições,
nada. Desertor, aqui, é o que pode haver de pior. Fim de carreira.
Pode ser o maior campeão, mas virou desertor, não tem mais chance
para nada', explicou Martha. (pág. 43)
"'Eu paguei por eles. Aqui em Cuba, como em qualquer país capitalista, se você tem dinheiro, pode comprar de tudo, não falta nada em sua casa'.
Pela primeira vez, desde que saímos de casa, ele parou e me olhou sério.
'Não existe embargo econômico para quem tem dinheiro'.
(...)
Caminhamos. Jaime Sete Léguas andou umas quadras como se estivesse em cima de um par de patins, e comecei a suar. Chegamos a um lugar ainda mais depauperado, uma espécie de armazém esquecido no tempo, uma das cenas mais desoladoras de Havana. Estamos na Oficina de Controle de Distribuição de Alimentos (Oficoda), que controla o funcionamento do sistema do mercado racionado. Existe há quase 50 anos". (pág 57)
"Celeste enfrenta cotidianamente o Estado revolucionário cubano, porque realiza, como milhares de habitantes da ilha, uma atividade comercial dentro de casa, sem autorização. Se for pega, terá que pagar multa e poderá ser presa, como os funcionários de uma empresa que iriam ajudar o israelense a instalar uma rede subterrânea de TV a cabo.
Em Cuba, só vive bem quem recebe dinheiro de parentes que vivem fora. O restante não tem acesso a quase nada, com essa desgraça dessa moeda nacional. Vivemos de restos. O carnê de alimentos é uma ilusão, porque não alimenta ninguém. O resultado é este: todo mundo tem que lutar de alguma forma.
Alguém chegou e perguntou algo inaudível. Me levantei do sofá e perguntei junto da porta o que era. Queria leite. Respondi que não tinha.
(...)
O que tem de melhor neste país, Samá, é vendido em peso convertible, a moeda que quase ninguém tem. Um CUC é igual a um dólar, entende? Como é que a pessoa vai ter esse dinheiro, se recebe em peso cubano, e o dinheiro não dá nem para sobreviver? Tudo que você pensar é em convertible: roupas, sapatos, produtos bons de beleza, eletrodomésticos. Não posso comprar uma sandália boa, porque custa 25, 30 dólares. E você acha que são sandálias boas, de marca? Nada, são sandálias ruins, que logo quebram". (pág. 100)
"VIVA ZAPATA!"
E por falar em Lula, dá pra entender ouvir de um líder metalúrgico, opositor de um governo ditatorial nos anos 70/80, inclusive com greve de fome, a comparação de alguns dissidentes cubanos em greve de fome a "bandidos de São Paulo"?! Tudo bem que muitos prisioneiros comuns ali na Ilha podem muito bem aproveitar-se da situação e se "converter-se" em presos políticos... Mas daí a não se ouvir uma palavra sequer do "Líder Internacional Lula" (resumindo-se tudo a "falar discretamente", em "conversas internas" sobre o polêmico assunto, no dizer do chanceler Celso Amorim, que fechou com o chavão que tanto agrada os ditadores cubanos: "Se alguém está interessado em uma evolução política em Cuba, eu tenho a receita rápida: acabe com o embargo") sobre a greve de fome (e consequente morte) de Orlando Zapata Tamayo, foi, no mínimo, uma decepção... Seria ainda por influência daquela eterna utopia, daquele sonho do paraíso comunista, que vence todas as adversidades, inclusive o "Império Ianque", com educação e saúde de Primeiro Mundo?! Não, não é possível...
Viagem ao Crepúsculo
Que bom que existe gente como o cearense-recifense jornalista Samarone Lima, que, no seu último e ótimo livro, Viagem ao Crepúsculo, lança mão de seus conceitos políticos idealizados e adoradores da velha e utópica Cuba com que muitos velhos esquerdistas ainda sonham (inclusive ele, antes de para lá viajar em 2007) para viver a realidade nua e crua de bairros pobres e do cotidiano de pessoas que fazem das tripas, coração para sobreviver numa Cuba nada 'libre'!
Assim, em seus parágrafos curtos e em tom de diário, o velho Samá (tal como os amigos cubanos passaram a chamá-lo) vai desfilando, com muito bom humor (alguns cubanos mais espertinhos são descritos por sua aparência, na ausência de um nome: "O garçom, com seu tradicional chapéu cubano, tinha uma cara de boxista médio-ligeiro ... 'O amigo vai comer o quê?', voltou Médio Ligeiro, me tirando da tranqüilidade do posto de observação."), o dia-a-dia real de um País "socialista" dividido entre ricos e pobres, nativos e estrangeiros, cheio de contrastes (Pesos cubanos e convertibles, Internet e jornais estrangeiros em hoteis suntuosos para turistas estrangeiros e Granma com uma eterna "realidade de conquistas" para os cubanos, TV estatal e TV a cabo proibida...) e de desesperanças para um povo que um dia acreditou, mas, que hoje, só luta para ganhar clandestinamente o sonho de comer um frango mais um dia, rezando baixinho, que é para Fidel não ouvir e encarcerá-lo por 20 anos em julgamentos céleres: “Quando esse inferno vai acabar?” - sussurra uma idosa em mais uma tentativa frustrada de adquirir sua cota mensal de carne no governo do então Presidente do Conselho de Estado da República de Cuba, Fidel Castro...
Seguem três ótimos trechos que bem poderiam ser enviados, por 'e-mail', para alguns presidentes ou pensadores socialistas esquecidos - ou, melhor ainda, ser incluídos os endereços dos autores destes desabafos nas rotas das próximas viagens, oficiais ou apenas turísticas, àquele País...
"Como em quase todas as conversas com os cubanos, não era necessário perguntar nada. Martha falou rapidamente sobre seu trabalho, e me perguntou:
'Sabe quanto um médico ganha em Cuba?'
'Não', respondi.
'Pouco mais de 40 dólares, brasileiro'.
Ela fez um silêncio para que eu assimilasse as informações, e prosseguiu:
'E o de um aposentado?'
'Não faço a menor idéia'.
'Pouco mais de 10 dólares', emendou Paco.
'É por isso que os médicos cubanos estão todos metidos em missões fora de Cuba. Estão na Venezuela, África, América Central. Nos hospitais de Cuba, o que mais a gente encontra é estudante de Medicina. Chamam isso de 'Médicos Internacionalistas', porque aqui eles conseguem criar nomes lindos para tudo.
(...)
Perguntei a Martha como estava a vida dos dois pugilistas cubanos
que tentaram fugir durante o Pan.
'Acabou tudo para eles, tudo. Não podem disputar mais competições,
nada. Desertor, aqui, é o que pode haver de pior. Fim de carreira.
Pode ser o maior campeão, mas virou desertor, não tem mais chance
para nada', explicou Martha. (pág. 43)
"'Eu paguei por eles. Aqui em Cuba, como em qualquer país capitalista, se você tem dinheiro, pode comprar de tudo, não falta nada em sua casa'.
Pela primeira vez, desde que saímos de casa, ele parou e me olhou sério.
'Não existe embargo econômico para quem tem dinheiro'.
(...)
Caminhamos. Jaime Sete Léguas andou umas quadras como se estivesse em cima de um par de patins, e comecei a suar. Chegamos a um lugar ainda mais depauperado, uma espécie de armazém esquecido no tempo, uma das cenas mais desoladoras de Havana. Estamos na Oficina de Controle de Distribuição de Alimentos (Oficoda), que controla o funcionamento do sistema do mercado racionado. Existe há quase 50 anos". (pág 57)
"Celeste enfrenta cotidianamente o Estado revolucionário cubano, porque realiza, como milhares de habitantes da ilha, uma atividade comercial dentro de casa, sem autorização. Se for pega, terá que pagar multa e poderá ser presa, como os funcionários de uma empresa que iriam ajudar o israelense a instalar uma rede subterrânea de TV a cabo.
Em Cuba, só vive bem quem recebe dinheiro de parentes que vivem fora. O restante não tem acesso a quase nada, com essa desgraça dessa moeda nacional. Vivemos de restos. O carnê de alimentos é uma ilusão, porque não alimenta ninguém. O resultado é este: todo mundo tem que lutar de alguma forma.
Alguém chegou e perguntou algo inaudível. Me levantei do sofá e perguntei junto da porta o que era. Queria leite. Respondi que não tinha.
(...)
O que tem de melhor neste país, Samá, é vendido em peso convertible, a moeda que quase ninguém tem. Um CUC é igual a um dólar, entende? Como é que a pessoa vai ter esse dinheiro, se recebe em peso cubano, e o dinheiro não dá nem para sobreviver? Tudo que você pensar é em convertible: roupas, sapatos, produtos bons de beleza, eletrodomésticos. Não posso comprar uma sandália boa, porque custa 25, 30 dólares. E você acha que são sandálias boas, de marca? Nada, são sandálias ruins, que logo quebram". (pág. 100)